O quadro superestimado da vacinação contra a covid-19 para abril, passado pelo Ministério da Saúde, começa a se adaptar à realidade e, por causa disso, a projeção de chegada de novos imunizantes já caiu pela metade. Mal começou o mês e a pasta atualizou o cronograma das doses, anunciando queda de 46% nas entregas: passou de 47,3 milhões para 25,5 milhões de injeções. Os números extremamente otimistas passados pelo governo federal evidenciam que, entre a contratação dos fármacos junto aos laboratórios e sua efetiva distribuição, a distância tem sido imensa.
Problemas na produção da Covishield pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), veto à Bharat Biotech – fabricante da Covaxin – pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e o fato de a Sputnik V ainda não ter autorização para uso emergencial frustram os números estimados pelo governo federal – que as incluiu no seu quantitativo. Sem detalhar o quantitativo nas entregas de cada laboratório para abril, o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, seguiu seu antecessor, Eduardo Pazuello, ao deixar pouco claro o quadro de entrega de imunizantes neste mês:
‘A previsão é de 25,5 milhões de doses. Há atraso na entrega de duas principais indústrias nacionais: Butantan e Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz). A questão da Bharat, vacina indiana, a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) suspendeu a planta’, justificou, em audiência no Senado.
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Problemas em série
Em análise técnica, a diretoria da Anvisa não só reprovou os documentos de boas práticas da Bharat, como desautorizou a importação de doses que tenham sido previamente produzidas até o momento, frustrando a chegada de 20 milhões de injeções: 8 milhões esperadas para março e outros 8 milhões para abril. Apesar de terem chegado, ontem, mais 225 litros de Ingrediente Farmacêutico Ativo (IFA), suficiente para produzir 5,3 milhões de doses da vacina de Oxford/AstraZeneca, o Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos (Bio-Manguinhos) reduziu as entregas de abril, de 21,1 milhões para 18 milhões. O motivo está ligado a uma intercorrência em uma das máquinas de envasamento, que atrasou o processo.
Com a matéria-prima que está no país, a fundação garante 35 milhões de doses a serem entregues ao Programa Nacional de Imunizações (PNI). Mas, por enquanto, foram repassados 8,1 milhões de doses da vacina Covishield, sendo 4 milhões de doses importadas da Índia e 4,1 milhões produzidos até ontem.
Máquinas paradas
Já o problema do Instituto Butantan é a entrega de mais IFA. Mesmo prevendo 15,7 milhões de unidades para o mês, a instituição informou que, até o momento, só tem o suficiente para liberar mais 4,5 milhões em abril. Ou seja: mais uma vez, podem parar as máquinas à espera de novas liberações chinesas.
Na conta das doses esperadas para março, ainda há 400 mil unidades da Sputnik V, imunizante russo cuja documentação somente passou a ser analisada pela Anvisa há poucos dias. A União Química, responsável pela fabricação no Brasil, entrou com um novo processo para conseguir a inclusão no Programa Nacional de Imunização (PNI) em caráter urgente e temporário – mas o processo está suspenso, aguardando complementação de documentos.
A agência, porém, concedeu certificado de boas práticas à União Química, indicando a abertura do caminho para a aprovação do uso emergencial. A farmacêutica é a primeira a produzir do zero uma vacina em território nacional, tendo apresentado, esta semana, o lote-piloto do IFA. A empresa pretende conseguir produção nacional já este mês, para além das 20 milhões de doses acordadas com o governo federal.
Mesmo com contratos fechados com a Pfizer e a Janssen, as primeiras doses dos dois laboratórios não são esperados para este mês. Na tentativa de acelerar as entregas e manter o ritmo da vacinação, com objetivo de alcançar 1 milhão de aplicações diárias, o ministro Marcelo Queiroga promete intensificar as tratativas internacionais. ‘Não é simples, mas estamos empenhados em usar todas as armas que temos’, garantiu aos senadores.