Os entraves que dificultam acelerar a vacinação no Brasil

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Com recordes consecutivos de mortes por covid-19, hospitais lotados e risco de falta de insumos para o atendimento de pacientes em situação grave, o governo federal continua sendo cobrado a acelerar a campanha de vacinação contra a doença no país. Ela é considerada a única saída para frear a pandemia, ao lado de medidas de alto custo social como o isolamento. O Brasil já contratou doses em quantidade suficiente para toda a população até o fim de 2021. Uma série de empecilhos, porém, têm emperrado as tentativas de agilizar o plano nacional de imunização.

Em audiência pública na Câmara dos Deputados na quarta-feira (31), o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, voltou a dizer que a meta da pasta é aumentar a capacidade de vacinação para 1 milhão de doses diárias, o que pode ser alcançado em abril graças ao fornecimento de vacinas produzidas no Brasil pela Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz).

Mas Queiroga reduziu pela metade a previsão de doses para o mês, repetindo o que já havia sido feito em março durante a gestão do ex-ministro Eduardo Pazuello, quando o cronograma foi modificado seis vezes. Para abril, segundo o ministro, estão previstas 25,5 milhões de doses. Antes, constavam 47,3 milhões de doses. Queiroga alegou atraso na entrega da Fiocruz e do Butantan e dificuldades para a aprovação da vacina indiana Covaxin.

Até quarta-feira (31), 35 milhões de doses haviam sido distribuídas aos estados, das quais 18,5 milhões haviam sido aplicadas. Dados da plataforma covid19br, que compila dados das secretarias estaduais de Saúde, apontam que o país conseguiu aplicar 825 mil doses em 26 de março. A lentidão foi questionada pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), após reunião com o ministro da Saúde na manhã de quarta.

‘Por que o Brasil distribuiu 34 milhões de doses de vacina e só temos 18 milhões de doses aplicadas? Eu não acredito, não acho que seja possível que nenhum governador e nenhum prefeito não esteja vacinando’, afirmou. Uma das possibilidades levantadas é o atraso na notificação. Por isso, Lira cobrou Queiroga a ‘aprimorar’ o sistema que monitora a vacinação.

3.869

foi o número de mortes pela covid-19 em 24 horas na quarta-feira (31), recorde desde o início da pandemia, segundo o Ministério da Saúde

O país tem ampla experiência em vacinação em massa e já conseguiu imunizar 80 milhões de pessoas contra a H1N1 em 2010 em três meses. Em 2020, apenas o estado de São Paulo vacinou 2,3 milhões de pessoas contra a gripe em apenas quatro dias. Queiroga afirmou na quarta-feira (31) que o Programa Nacional de Imunizações, com suas 37 mil salas de vacinação espalhadas pelo país, poderia vacinar até 2,4 milhões por dia, perto do que os Estados Unidos vem fazendo.

8,32%

da população brasileira foi imunizada com uma dose até quarta-feira (31), e apenas 2,4%, com duas, segundo levantamento do consórcio de veículos de imprensa

‘Qual é o nosso principal problema? Nós não temos uma regularidade dessas doses aqui conosco no Ministério da Saúde, e a distribuição é feita logo que essas doses de vacinas chegam ao país’

Marcelo Queiroga

ministro da Saúde, durante audiência na Câmara, na quarta-feira (31)

Apesar dos atrasos em abril, o ministro voltou a dizer que o governo planeja distribuir 563 milhões de vacinas até o final de 2021. Mas afirmou aos deputados federais que não poderia se comprometer com a pontualidade das entregas enquanto as doses não estiverem no Brasil.

‘Estamos empenhados em antecipar a entrega, não é simples (…). Recursos existem, o que ocorre é falta de vacina’, disse. Ele afirmou ainda que mesmo as vacinas produzidas pela Fiocruz e pelo Butantan podem ter problemas com a importação dos insumos da China.

As dificuldades da vacina indiana

Em seu cronograma, o governo previa distribuir 20 milhões de doses da vacina indiana Covaxin, produzida pelo laboratório Bharat Biotech, entre março e maio. Ela tem autorização para uso emergencial na Índia, mas não no Brasil.

Na terça-feira (30), a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) negou a certificação de boas práticas de fabricação à Bharat Biotech, depois que técnicos da agência fizeram uma inspeção na fábrica da empresa em março com o objetivo de avaliar as estruturas físicas para a produção, o armazenamento e o controle de qualidade do imunizante.

O certificado é um requisito para que o produto obtenha registro definitivo ou autorização para uso emergencial no Brasil. Empresas como a Pfizer, a Janssen (farmacêutica da Johnson & Johnson), a Sinovac (que desenvolveu a Coronavac) e a AstraZeneca (que produz a vacina de Oxford) já receberam o certificado.

Segundo a Anvisa, foram identificados dezenas de pontos em desacordo com os requisitos exigidos pela legislação nacional. Eles poderiam implicar em ‘risco sanitário aos usuários’. Entre eles estão a falta de precauções para garantir a esterilidade do produto, a falta de controle de pureza e do ‘conteúdo antigênico e da potência da vacina’ (isso significa que a vacina pode ter variações em seu conteúdo, fazendo com que o paciente possa receber doses não homogêneas, o que não garantiria a mesma eficácia apresentada nos testes).

Na quarta-feira (31), a Anvisa também negou um pedido de autorização excepcional feito pelo Ministério da Saúde para a importação e a distribuição da Covaxin. A agência alegou que não houve a entrega de todos os documentos necessários, como dados técnicos sobre a vacina, certificado de liberação dos lotes importados e licença de importação. Também havia inconsistências sobre a quantidade de doses e o prazo de validade dos imunizantes.

Questionado sobre o que faria em relação aos imunizantes indianos, Queiroga afirmou na Câmara dos Deputados que iria esperar uma contestação da fabricante Bharat Biotech sobre o processo que corre na Anvisa. A farmacêutica pode recorrer da decisão que negou o certificado e realizar mudanças para se adequar às exigências.

O ministro também levantou a possibilidade de a assessoria jurídica da pasta pedir na Justiça a aprovação para o uso do imunizante com base na lei que autoriza sua aplicação caso a vacina tenha sido aprovada em seu país de origem, que é o caso da Covaxin.

A situação das outras vacinas

Janssen

A Anvisa aprovou na quarta-feira (31) a autorização temporária para o uso emergencial da vacina da Janssen, já em uso nos Estados Unidos, Canadá e Europa. A vantagem do imunizante é que ele requer a aplicação de apenas uma dose, diferentemente do que ocorre com todas as outras vacinas. O problema é que as 38 milhões de doses negociadas pelo Ministério da Saúde só estão previstas para novembro.

Pfizer

Em audiência na Câmara, Queiroga reafirmou que a pasta está buscando ‘formas de antecipar as doses’ contratadas com a Pfizer. Na segunda-feira (29), ele já havia anunciado novas negociações e conversas com o governo americano. A vacina da Pfizer já tem registro definitivo na Anvisa, e 100 milhões de doses já foram contratadas pelo Ministério da Saúde. O cronograma prevê que elas só comecem a ser entregues em maio (e o restante em agosto) – Queiroga pediu que 50 milhões sejam enviadas ‘o quanto antes’. O governo recusou ofertas da empresa em 2020, que poderiam ter resultado em um cronograma melhor.

Sputnik V

A Anvisa também concedeu na terça-feira (30) o certificado de boas práticas de fabricação à Inovat Indústria Farmacêutica, do grupo União Química, em Guarulhos, na Grande São Paulo. A empresa brasileira tem acordo para a fabricação do imunizante russo Sputnik V no país. No sábado (27), porém, a agência reguladora havia suspendido o prazo de análise do pedido de uso emergencial da vacina por falta de apresentação de dados solicitados. O prazo, que era de sete dias, só volta a ser contado com a complementação da documentação. O cronograma do Ministério da Saúde prevê 10 milhões de doses, das quais 400 mil seriam distribuídas em abril, caso haja autorização.

O que se sabe sobre o vírus?

O QUE É A COVID-19?

A covid-19 é uma doença infecciosa causada por um novo vírus da família dos coronavírus. Essa nova doença tem origem ainda incerta, mas o mais provável é que o vírus tenha vindo de animais vendidos no mercado central de Wuhan, metrópole chinesa onde o agente infeccioso foi descoberto, em dezembro de 2019.

QUAIS SÃO OS SINTOMAS?

Além dos sintomas típicos da gripe – como febre, tosse, dor muscular e cansaço -, o coronavírus pode afetar o sistema respiratório da vítima, causando pneumonia e podendo matar. Alguns pacientes relatam perda de olfato e paladar. As pessoas mais suscetíveis às consequências graves do vírus são idosos e pessoas com condições pré-existentes.

COMO É A TRANSMISSÃO?

O novo coronavírus é transmitido pelo contato com secreções de pessoas contaminadas: gotículas de saliva expelidas na fala, espirro, tosse, ou com o aperto de mão ou toque em locais contaminados seguidos de contato com boca, nariz e olhos. Em julho de 2020, a Organização Mundial de Saúde reconheceu que o contágio também pode ocorrer por meio de aerossóis, partículas que podem ficar suspensas no ar por longos períodos de tempo.

COMO É POSSÍVEL SE PREVENIR?

Para reduzir os riscos de contágio e de transmissão, o Ministério da Saúde recomenda medidas como evitar contato próximo com doentes, cobrir nariz e boca quando espirrar ou tossir, evitar tocar mucosas de olhos, nariz e boca e manter os ambientes bem ventilados. Lavar frequente e adequadamente as mãos é uma das principais recomendações, uma vez que expor o vírus ao sabão o destrói com eficácia. Devido ao avanço da pandemia, governos e especialistas têm recomendado (e, em alguns países, imposto) a adoção do distanciamento social, um esforço coletivo em reduzir o contato entre as pessoas para conter a transmissão dos vírus, e o uso de máscaras e protetores faciais. Aglomerações e reuniões em lugares fechados devem ser evitadas.

EXISTE TRATAMENTO?

Até 31 de dezembro de 2020, não existia um tratamento específico para o vírus. A recomendação é que as pessoas infectadas fiquem isoladas por 14 dias, em repouso e se hidratando, e que permaneçam em observação. Elas podem usar analgésicos, sob orientação médica, para aliviar os sintomas. Também podem monitorar a oxigenação do sangue por meio de oxímetros vendidos em farmácias – se o nível estiver abaixo de 96%, devem procurar serviço médico. Além disso, é recomendável que todas as pessoas com quem o infectado entrou em contato nas duas semanas anteriores ao diagnóstico façam quarentena. O único medicamento que comprovadamente reduz a mortalidade pela covid-19 é o corticóide dexametasona, usado apenas em pacientes em estado grave que estão recebendo ventilação mecânica. Em dezembro de 2020, as primeiras vacinas contra a covid-19 concluíram seus testes. Até 31 de dezembro de 2020, mais de 40 países haviam começado a imunizar parcelas da população.

QUAL A LETALIDADE DO VÍRUS?

A letalidade da covid-19 está estimada em torno de 3% e 4%. Essa estimativa é baseada apenas em casos confirmados da doença, ainda que somente uma pequena parte da população seja submetida a testes para detectar o vírus, e que haja uma fração dos infectados que não apresentam sintomas e, por isso, tendem a não buscar a testagem. A taxa estimada para a covid-19 representa um nível menor de letalidade do que a de outras doenças, como, por exemplo, a Sars (síndrome respiratória aguda grave, que se alastrou entre os anos 2002 e 2004). No entanto, causa grande preocupação a rapidez da transmissão do novo tipo de coronavírus e a alta letalidade dele em pessoas do chamado ‘grupo de risco’, acima dos 60 anos e/ou com condições respiratórias, cardiovasculares ou imunológicas pré-existentes.

O Nexo também tem um Índex com todos os conteúdos produzidos pelo jornal sobre a pandemia. Eles estão com acesso livre.

Fonte: Nexo Jornal

Veja também: https://panoramafarmaceutico.com.br/2021/03/18/vacina-da-johnson-johnson-e-autorizada-pela-oms/

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