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Quando os remédios afetam a mente e o comportamento

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Sempre que escrevo sobre crianças que recebem medicamentos para ansiedade, depressão ou, especialmente, para o transtorno de déficit de atenção e hiperatividade, alguns leitores reagem com revolta e suspeita, acusando-me de ser parte de uma conspiração para medicar os pequenos que apresentam comportamentos inerentes a uma fase da infância ou que são resultados diretos de escolas, ambientes ou maus-tratos.

 

Outros sugerem que os médicos que prescrevem tais medicamentos são controlados por empresas farmacêuticas. E há histórias de efeitos colaterais inesperados e médicos que não prestam a devida atenção. (Claro, há também os pais que escrevem para dizer que a medicação certa no momento certo realmente ajudou, ou adultos lamentando que ninguém lhes ofereceu o que poderia tê-los ajudado quando estavam enfrentando um momento difícil.)

 

O uso de medicamentos psicotrópicos em crianças, especialmente as pequenas, é assustador para os pais, às vezes assustador para os próprios pacientes e, também, muitas vezes, assustador para os médicos que fazem a prescrição. Como pediatra, eu me vi em inúmeras ocasiões agradecida aos colegas com mais experiência e treinamento que puderam ajudar uma família a descobrir a medicação, a dosagem e o acompanhamento corretos.

 

A questão é importante, existem efeitos colaterais preocupantes, e os médicos precisam ouvir os temores das famílias, mas quando uma criança está sofrendo e enfrentando problemas, os familiares precisam de ajuda, e os medicamentos são muitas vezes parte da discussão. Assim, sem querer julgar o que deve ser feito em casos específicos, gostaria de abordar a discussão obrigatória sobre a medicação de um jovem em dificuldades, e como o médico e a família devem monitorar esses remédios quando são prescritos.

 

Os pais temem que os medicamentos afetem a personalidade dos filhos, segundo a Dra. Doris Greenberg, pediatra de desenvolvimento em Savannah, Geórgia, que é professora associada de Clínica Pediatria na Faculdade de Medicina da Universidade Mercer. “Chegam com o medo estampado no rosto, tipo: ‘Meu filho é animado, tem vivacidade, não queremos que isso se perca.’ Por isso, já perguntando de cara com o que realmente estão preocupados e as histórias de horror que já ouviram.”

 

“A família provavelmente já vem lidando com uma criança sintomática por um tempo, e quando chega aqui, já está meio abalada. Antes de falar sobre a medicamentação, é importante ter a certeza de que a família compreende como o diagnóstico está sendo feito e porque o remédio está sendo considerado uma opção. Não podemos medicar uma criança só porque ela é agitada.”

 

O Dr. Timothy Wilens, chefe da divisão de Psiquiatria Infantil e Adolescente do Hospital Geral de Massachusetts, disse: “A questão do medicamento é que ela determina se seu filho tem um problema de saúde comportamental, ou seja, se tem uma desordem que exige tratamento”. Wilens, autor de um livro recomendado sobre remédios psiquiátricos para crianças, enfrentou críticas no passado sobre seus laços com empresas farmacêuticas, porém considera uma obrigação acadêmica trabalhar com a indústria, e divulga isso diretamente aos pais.

 

Segundo ele, na primeira consulta é especialmente importante discutir o diagnóstico com os pais e ter certeza de que concordam com o que foi dito. “Paro toda hora e pergunto se estão entendendo. Já para a criança, digo o que acho que seja e pergunto se os sintomas lhe são familiares.”

 

A medicação nem sempre é indicada. “Para a ansiedade, provavelmente não vou recomendar remédios imediatamente; prefiro falar da terapia cognitivo-comportamental”.

 

“Depois que a possibilidade do remédio é levantada, os pais precisam de um pouco de espaço e tempo para pensar sobre o fato, e pode levar mais de uma consulta até que eu chegue ao ponto de efetivar a receita.”

 

O que mais preocupa os pais, é claro, é a segurança. “Já vou direto aos maiores medos que eles têm, como por exemplo, se pode fazer mal, quais os efeitos colaterais, e as piores coisas que podem acontecer.”

 

Greenberg disse que, às vezes, menciona um estudo de Milwaukee que acompanhou o crescimento de crianças com TDAH e sugere que aqueles cujo quadro foi tratado quando jovens tiveram menos problemas com drogas e alcoolismo. “Enfatizo que este não é apenas uma questão escolar, é de vida”, disse ela. Wilens citou um estudo de 2017 que também mostra que o tratamento do TDAH é associado a menos abuso de substâncias no futuro.

 

“O médico também deve falar diretamente com a criança, mesmo as mais novas, explicando o tratamento, respondendo perguntas e recebendo o consentimento. Nunca deve prometer que a medicação fará o impossível; na verdade, não cura nada, mas corrige o problema. Explico que faz o cérebro funcionar melhor, mas não vai arrumar namorado(a), nem transformar ninguém em dançarino”, disse Greenberg.

 

Prescrever drogas psicotrópicas para crianças envolve muita atenção a seus ritmos e padrões. “Quero saber sobre seus hábitos alimentares, pois alguns medicamentos para tratar TDAH podem reduzir o apetite”, disse Greenberg. É importante saber se preferem comer à noite ou no café da manhã, e cronometrar a dosagem de modo que interfira o menos possível – e então monitorar com cuidado o crescimento da criança.

 

E o médico deve verificar regularmente as questões do sono; às vezes uma criança não consegue tolerar uma dose de estimulante à tarde sem enfrentar problemas para dormir. “Um bom padrão de sono é importante e é aconselhável para crianças com TDAH acordar sempre no mesmo horário, inclusive nos fins de semana”, disse Wilens.

“O médico deve explicar como funciona a dosagem. Eu sempre explico qual é o intervalo terapêutico porque algumas pessoas metabolizam rapidamente, outras não, então sempre começamos de baixo e vamos aumentando. As famílias precisam entender a farmacologia e o que fazer caso se esqueçam de uma dose”, disse Greenberg.

“Os efeitos colaterais importam, e muito. Digo aos pais que é como o velho seletor de um rádio analógico: não basta chegar à estação, tem que ajustá-la perfeitamente”, disse Wilens.

 

E ninguém deve começar a dar esses medicamentos a uma criança sem um acompanhamento – os pais precisam poder ligar imediatamente para o médico se tiverem alguma dúvida, e a criança precisa voltar em intervalos regulares.

 

Esses remédios afetam a mente, mas a mente é parte do corpo. “Fazemos um exame físico completo em quase todas as visitas”, disse Greenberg.

 

O acompanhamento também dá aos pais a oportunidade de relatar o que veem; podem dizer se os remédios estão funcionando e acabam ficando craques em saber quando as doses precisam ser ajustadas. Segundo Wilens, quando os pais sentem que são realmente parte da equipe, perdem aquela desesperança e desamparo com os quais chegam quando veem que o filho tem um problema de saúde comportamental, e isso ajuda a todos a cuidar melhor da criança.

Fonte: Gaúcha ZH

 

Veja também: https://panoramafarmaceutico.com.br/2020/08/24/o-preco-dos-remedios-em-hospitais-subiu-16-na-pandemia-quem-paga/

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