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‘Somos vítimas do sucesso alcançado pela vacinação’

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Desaparecimento de doenças graves também eliminou o medo que estimulava busca pela prevenção, diz um dos fundadores de Bio-Manguinhos, da Fiocruz.

CESAR BAIMA

Um dos mais influentes especialistas da indústria global de imunizantes, o brasileiro Akira Homma vê as vacinas como vítimas de seu próprio sucesso. Ao eliminar doenças como o sarampo e a poliomielite, elas também removeram a memória e o medo das pessoas de males que fizeram milhões de vítimas no passado. Prestes a completar 80 anos, um dos fundadores do Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos da Fiocruz (Bio-Manguinhos) diz que governos e população afrouxaram a vigilância, levando à queda na cobertura vacinal que abre caminho para a volta dessas doenças. Em entrevista ao GLOBO, defende mudanças na estratégia de vacinação, com mais informação sobre os benefícios individuais e coletivos da vacinação.

Como o sr. vê a volta de doenças praticamente erradicadas, como o sarampo no Rio?

Uma doença só é de fato erradicada quando isso acontece globalmente, como foi com a varíola no fim dos anos 1970. Fora isso, são apenas eliminadas regionalmente. No Brasil, são os casos da poliomielite (em 1994), do sarampo (em 2016) e da rubéola um pouco antes. Não tínhamos mais nenhum caso autóctone destas doenças há anos, mas isso não quer dizer que elas não podem voltar. Sempre há o risco. Por isso não podemos relaxar na vacinação.

A queda na vacinação explica o risco de volta do sarampo e da pólio em mais de 300 cidades, conforme dados recentes do Ministério da Saúde?

A Fiocruz, foi criada por causa destas doenças infeciosas. No início do século passado, aqui no Rio tínhamos febre amarela, peste bubônica, varíola, doenças que matavam milhares de pessoas. A eliminação destas doenças exigiu um esforço muito grande de Oswaldo Cruz, mas para isso ele teve apoio total do governo e, depois, da própria sociedade. Os resultados mostraram que era necessário.

Se Oswaldo Cruz conseguiu isso na virada do século passado, porque não podemos agora?

Somos vítimas do sucesso alcançado pela vacinação. As vacinas desapareceram com doenças importantes que vitimaram milhões de pessoas ao longo da História. Hoje temos o menor número de notificações compulsórias destas doenças imunopreveníveis, e com isso a população já não se sente mais ameaçada por elas. Veja só o recente surto de febre amarela. Quando tivemos os primeiros casos, houve uma corrida pela vacina, com filas nos postos de saúde. Mas logo depois o desinteresse voltou.

A saída é a vacinação compulsória?

Ao dizer que “a saúde é direito de todos e dever do Estado” a Constituição está errada. Os indivíduos também têm que colaborar para a sanidade coletiva. A vacinação não deve ser uma opção individual, deve ser uma obrigação, um dever do cidadão, pois é o bem coletivo que está em jogo. Cada pessoa tem sua dose de responsabilidade. O último surto de febre amarela começou no interior de Minas, uma região endêmica da doença e de vacinação recomendada

Apesar disso, havia áreas lá em que apenas 40% da população era vacinada. Não dá para entender isso. A pessoa sabe que está em uma região de risco e mesmo assim não toma a vacina. E não foi por falta de doses. Por isso precisamos, por exemplo, ampliar o acesso. Na situação econômica que está o país, todo mundo tem que trabalhar, mas os postos de vacinação só funcionam em horário comercial. É necessário ter mais flexibilidade nisso, com os postos abrindo em horários mais extensos, aos sábados, domingos e feriados.

Que outras estratégias poderiam ser efetivas para aumentar a cobertura vacinal?

No geral, o sistema de vacinação nos municípios é passivo no lado da oferta. Fica-se esperando a pessoa vir se vacinar. Temos que repensar isso. É preciso uma estratégia ativa, ir atrás das pessoas. O sistema pode incorporar, por exemplo, os avanços na tecnologia da informação. Hoje já temos a vacinação contra a pólio com registro nominal da criança. Com estas tecnologias, podemos saber quais são as crianças numa determinada região, quais delas tomaram a vacina e quais não, num monitoramento que pode trazer a cobertura vacinal de volta aos níveis necessários para eliminar estas doenças, de 95% ou mais. Mas para isso precisamos investir.

Fonte: O Globo

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