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Transferência de tecnologia de vacinas ao Brasil pode demorar até dez anos

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Enquanto países buscaram desenvolver suas próprias vacinas contra a Covid-19, o Brasil firmou acordos para obter vacinas desenvolvidas em outros países, com transferência de tecnologia entre a Universidade de Oxford/AstraZeneca e a Fiocruz e entre a empresa Sinovac e o Instituto Butantan.

Na última terça-feira, o Ministério da Saúde firmou um acordo com o governo de SP para a compra de 46 milhões de doses da Coronavac, a vacina da Sinovac, a serem produzidas até dezembro, o que gerou um conflito entre o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e o ministro da saúde, Eduardo Pazuello.

Embora o Butantan afirme que vai entregar as doses até o início de 2021, esse primeiro lote deve ser apenas envasado e rotulado no país, a partir das vacinas prontas vindas da China. A absorção completa da tecnologia pode demorar até dez anos.

Seguindo o modelo de produção de PDPs (parcerias de desenvolvimento produtivo), nenhuma transferência de tecnologia de vacina incluída no PNI (Programa Nacional de Imunização), à exceção da vacina da gripe, foi concluída.

Mesmo a transferência de tecnologia da vacina da gripe foi um processo demorado, que durou 14 anos. “Quando entrei [na diretoria], minha primeira ação foi finalizar a fábrica da vacina. Os projetos das outras fábricas estavam em andamento quando saí do instituto, mas nunca foram terminados”, afirma Jorge Kalil, ex-diretor do Instituto Butantan e pesquisador do Incor.

Até 2012, o Ministério da Saúde firmava convênios para compra de vacinas e financiava equipamentos nos laboratórios nacionais, sendo os principais deles responsáveis por cerca de 75% das vacinas para o PNI, o Butantan e Bio-Manguinhos (Fiocruz).

A partir de 2012, esses convênios passaram a se chamar PDPs e, além da compra das doses, foram incluídos também recursos para construção -ou readequação- das fábricas, incorporação da tecnologia e treinamento.

A farmacêutica se compromete a treinar e a capacitar a equipe nacional. Em contrapartida, os laboratórios mantêm um acordo de, no mínimo, quatro anos de compra de doses, sendo que no primeiro ano fazem apenas envase e rotulagem -o que deve acontecer com a vacina da Sinovac no Butantan.

Outro ganho para a empresa estrangeira é a escala, uma vez que as fábricas têm capacidade para produzir e exportar. Para a vacina da Covid-19, essa será uma vantagem, uma vez que a primeira vacina que tiver sucesso nos ensaios clínicos poderá ser vendida no mercado global.

“É um acordo muito favorável para as farmacêuticas. Se a transferência de tecnologia demora muito para concluir, elas têm a vantagem quase total do mercado”, afirma Kalil.

Para o pesquisador, o país poderia ganhar com a tecnologia adquirida nas últimas duas décadas e investir em pesquisa e desenvolvimento, mas isso não ocorreu. “Havia um plano de fazer uma fábrica de hemoderivados no Butantan, com acordo de transferência de tecnologia, antes da minha gestão. Mesmo hoje, três anos depois, a fábrica ainda não foi completada.”

Alguns centros fabris já são habilitados para envase e rotulagem, mas a produção em si, que inclui culturas em células de vírus ou bactérias, necessita instalações especiais. Para a Coronavac, o Butantan deve usar o espaço preexistente da fábrica de hemoderivados.

Além de uma nova tecnologia, outra vantagem das PDPs é ampliar a demanda e diminuir os custos, uma vez que prevê a renegociação dos preços unitários das doses. Em poucos anos, o governo pode passar a comprar apenas do laboratório nacional, sem precisar importar.

Na prática, porém, isso não acontece. Mesmo após a incorporação da vacina da gripe, o preço unitário da dose passou de R$ 8,44, em 2014, para R$ 15,12 em 2020. Em 2018, o MS contratou 60 milhões de doses da vacina, sendo 55 milhões produzidas no instituto e outras 5 milhões importadas, ao custo adicional de R$ 47,6 milhões.

Essa e outras questões levaram o Tribunal de Contas da União (TCU) a realizar, em 2014, uma auditoria em três fábricas de vacinas: Butantan, Bio-Manguinhos e Fundação Ezequiel Dias (Fiocruz de MG).

Segundo o TCU, o MS não realiza uma pesquisa das vacinas em desenvolvimento no país antes de firmar as PDPs e os reajustes de preços não ocorrem.

A assessoria de imprensa do Instituto Butantan informou que os valores dos contratos firmados com o MS são definidos em comum acordo e que “as definições, tanto de volumes quanto valores de doses, são renegociados anualmente, de acordo com as necessidades do próprio MS”.

Dessa forma, muitas PDPs (incluindo para medicamentos) não são aceitas. Os projetos são apresentados primeiro à Conitec (Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS), para avaliar se a incorporação da tecnologia é válida, e aos órgãos de controle, que verificam a transparência no valor investido.

“Seguindo as leis de compra com verba pública no país, investir em tecnologia que não existe é extremamente arriscado. Por isso, o governo apresenta à Corregedoria Geral da União e ao TCU quais serão os ganhos do Brasil com aquela tecnologia. É um investimento em algo que não existe ainda”, explica Elize Massard da Fonseca, pesquisadora da Escola de Administração de Empresas da Fundação Getúlio Vargas que analisa transferências de tecnologia no país.

Originalmente, as PDPs foram criadas para absorver as tecnologias desenvolvidas fora do país e têm o mérito de diminuir os gastos com políticas de saúde pública. “Sem as PDPs, não compraríamos as vacinas e medicamentos ao preço que compramos. O Brasil é o único país da América Latina com capacidade de absorver essa produção em larga escala.”

Em relação aos prazos para transferência de tecnologia, o instituto informou que as PDPs das vacinas do HPV, dTPA (difteria, tétano e pertussis acelular) e hepatite A, mantidas pela pasta, tiveram prazo de vigência, inicialmente de 5 anos, ampliados para 10 anos para finalização dos processos pelos laboratórios envolvidos.

No caso da vacina da Oxford, o acordo de transferência de tecnologia tem três pilares: “a adequação da fábrica, o controle de qualidade e a incorporação da tecnologia de vetor viral não replicante, algo inédito no país”, diz Fonseca. A vacina é feita a partir de um adenovírus de chimpanzé, o ChAdOx1, modificado e inativado.

O Instituto Butantan não divulga o acordo feito com a Sinovac; apenas diz se tratar de uma vacina de vírus inativado, uma tecnologia que o instituto já domina há anos.

Em nota, o ministério da Saúde negou compromisso para compra de vacinas da Coronavac e reafirmou ter um protocolo de intenções para compra de uma possível vacina brasileira com o Instituto Butantan.

Recentemente, o governo da Rússia anunciou aguardar registro da Sputnik V no Brasil em dezembro. O país russo tem acordos com o governo da Bahia e do Paraná para produção da vacina no país. A vacina russa não está, até agora, no cronograma divulgado pelo Ministério da Saúde na última quarta-feira (14).

Fonte: Seleções Brasil 

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