Ações do varejo farmacêutico em queda preocupam analistas
Resultados nos últimos 12 meses refletem elevação de custos financeiros e intensa dinâmica concorrencial
por Márcia Arbache em


A queda das ações do varejo farmacêutico nos últimos 12 meses até agosto vem acendendo o sinal de alerta entre investidores e analistas. O Panorama Farmacêutico ouviu especialistas para entender o desempenho oscilante do setor no mercado financeiro, que reflete uma combinação de custos financeiros elevados, dinâmica competitiva intensa e, desafios operacionais.
A RD Saúde acumula recuo de 41,3% no período, de acordo com dados de performance na Bovespa. Em moeda americana, segundo o MarketBeat, a redução no valor das ações chega a 32,5%.
No caso das Farmácias Pague Menos, embora o balanço dos últimos dois trimestres sinalize um princípio de recuperação, o resultado ainda é insuficiente para reverter indicadores como registrado entre outubro e dezembro do ano passado . Na ocasião, o lucro foi 47,3% inferior ao do mesmo intervalo anterior, mesmo com avanço de 16,9% na receita líquida. Essa performance resultou em queda de 8,7% na cotação no pregão.
A recente incorporação de uma farmácia pelo Mercado Livre reaqueceu o debate. Nos três dias que sucederam o anúncio da estreia da plataforma de marketplace no segmento, o valor das redes de farmácias na B3 despencou R$ 2,3 bilhões. A RD foi a que mais perdeu, com perda de R$ 2,1 bilhões. Já a Pague Menos encolheu 5,8%, perdendo R$ 140 milhões em capitalização. A Panvel caiu 3,8% no período e vale agora R$ 1,6 bilhão.
Correlação entre ações do varejo farmacêutico e juros altos
Entre os muitos fatores que podem impactar as ações do varejo farmacêutico, a taxa de juros ocupa posição relevante. “As redes são empresas de compra e revenda que precisam permanentemente girar o capital. Para isso, é necessário que façam bom uso dos recursos e, provavelmente, vão se alavancar tomando empréstimos. Com juros elevados, a tendência é se endividarem, o que provoca oscilações em ativos de renda variável”, comenta Edmilson Varejão, CEO da Proffer e integrante da seção Os Especialistas do Panorama Farmacêutico.
Ele lembra ainda que a estratégia de negócios mais agressiva, com foco principalmente em aquisição de lojas, é um motivo adicional para reforçar a alavancagem. Além disso, algumas projeções indicam redução de crescimento e menor apetite para consumo do lado das famílias ‘’Sabemos que, para o mercado acionário, o que vale é a expectativa futura, não o que aconteceu agora ou no passado”, destaca.
A afirmação vai ao encontro do entendimento de Luiz Guanais, analista do BTG Pactual. Apesar de ressaltar o crescimento no segundo trimestre, favorecido pelas vendas de genéricos e OTC, ele adverte para a sensibilidade do segmento às condições macroeconômicas futuras.
“Há preocupação de que as restrições de crédito nos próximos meses possam impactar o consumo. Os juros altos representam um risco para o ritmo de desalavancagem do setor. Após uma corrida pelos papéis entre abril e junho, muitos investidores reduziram exposição”, observa.
RD pode sofrer com acirramento da concorrência digital
Economista de formação, Varejão vê os varejistas trilhando caminhos diferentes nos últimos três anos. “A RD sempre teve valuation expressivo e estava precificada no nível mais alto, mas apresentou resultados um pouco aquém dos planejados, principalmente nos últimos dois trimestres’’, pontua.
Para ele, a concorrência do varejo digital pode ter colaborado para o recuo dos papéis. ‘’O mix de produtos vendidos online apresenta uma intersecção grande com os itens oferecidos por marketplaces como Mercado Livre. A pergunta é quem vence essa competição?’’, indaga.
Pague Menos ainda digere compra da Extrafarma
Já as Farmácias Pague Menos ainda estão ingerindo a compra da Extrafarma, concretizada em agosto de 2022. “Foi uma grande aquisição. E quando se engole um bicho quase do seu tamanho, leva-se mais tempo para o organismo absorver’’, contextualiza Varejão.
“Os resultados recentes devem gerar revisões positivas nos lucros esperados, mas é preciso considerar desafios como o menor reajuste dos preços dos medicamentos (PMC) neste ano e a maior concorrência nas categorias de higiene, beleza e cuidados pessoais”, acrescenta Vitor Pini, analista do Banco Safra.
O reajuste do PMC, determinado pela CMED em março, foi de 3,83% para medicamentos de média concorrência – inferior à inflação acumulada e o menor aumento registrado desde 2018. “A medida reprimiu uma alta maior dos preços de medicamentos e influi diretamente nas margens”, diz Varejão.