Controladoria-Geral de MG identifica irregularidades nas compras de respiradores e de testes para Covid

Acompanhe as principais notícias do dia no nosso canal do Whatsapp

Relatórios feitos pela Controladoria-Geral do Estado apontam uma série de irregularidades e falhas nos processos de compras de respiradores e de testes RT-PCR feitos pela Secretaria de Estado de Saúde para enfrentamento da Covid em Minas Gerais.

Itens comprados em quantidades insuficientes, seleção de fornecedores sem verificação de autorização da Anvisa, contratos baseados em estimativas e sem destinação dos produtos e até orçamentos com negócios que não são do ramo estão entre os achados das auditorias.

Segundo a CGE, a primeira falha cometida pelo governo, tanto no processo para a compra de respiradores quanto para a aquisição de testes de Covid-19, foi a elaboração do Termo de Referência após a escolha da empresa.

Conforme entendimento do Tribunal de Contas da União, mencionado pela Controladoria, este documento é obrigatório e deve ser feito antes até mesmo do processo de cotação de preços para detalhar, a partir de estudos técnicos, o produto que será adquirido, quantidade necessária, requisitos e outros.

Mas a Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão (Seplag) alegou ao G1 que “os termos de referência contêm o nome da empresa, as reais condições de entrega e pagamento e o preço ou custo da contratação. Sendo assim, para conter tais informações, o termo de referência não poderia ser elaborado antes da consulta à disponibilidade dos produtos no mercado e, consequentemente, da apresentação de uma proposta factível.”

Respiradores

A Secretaria de Estado de Saúde fez dois contratos para a compra de 1.047 respiradores. Um com a KTK Indústria, para a aquisição de 747 aparelhos, sendo 185 para transporte, no valor total de R$ 43,9 milhões. O outro contrato, com a Air Liquide, previa a compra de outros 300 equipamentos, no valor final de R$ 7,3 milhões.

Diferente do que diz Zema, mais da metade dos respiradores comprados pelo governo não foram os ‘mais baratos do país’

Valor de cada respirador adquiridos pelos estados varia de R$ 40 mil a R$ 226 mil no país

Diferente do que diz Zema, mais da metade dos respiradores comprados pelo governo não foram os ‘mais baratos do país’

Valor de cada respirador adquiridos pelos estados varia de R$ 40 mil a R$ 226 mil no país

As duas contratações foram feitas levando em consideração estimativas, com base em uma possível abertura de leitos – o que, para a CGE, representa risco de comprar algo que não atenda a demanda. Não existia uma definição prévia de quais hospitais nem quais municípios receberiam os equipamentos.

Ainda de acordo com o relatório da CGE, a expectativa da Secretaria de Estado de Saúde em abril do ano passado era de abrir 1.655 novos leitos, para os quais seriam necessários 1.517 respiradores. Apesar desta estimativa, não há explicação nestes processos de por que a aquisição foi abaixo do esperado e as providências adotadas para a aquisição dos demais.

‘O levantamento por estimativa da quantidade a ser contratada, sem estudos mais profundos relativos à necessidade, aumenta o risco de não atender por completo a demanda frente à pandemia ou superestima o objeto da contratação. E pode resultar em compras desnecessárias e perdas de insumos’, pondera um dos relatórios.

‘O levantamento por estimativa da quantidade a ser contratada, sem estudos mais profundos relativos à necessidade, aumenta o risco de não atender por completo a demanda frente à pandemia ou superestima o objeto da contratação. E pode resultar em compras desnecessárias e perdas de insumos’, pondera um dos relatórios.

A Seplag disse ao G1 que, além destas compras do governo, houve recebimento de doação de 100 respiradores da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg) e reparo de outros junto a parceiros da iniciativa privada, o que garantiu a ampliação dos leitos.

No caso dos respiradores adquiridos da KTK, o processo de compra levou em consideração o preço de referência do Ministério da Saúde, de R$ 60.141 a unidade, para os dois tipos – o utilizado em leitos e o de transporte. Mas, enquanto o modelo para utilização em leitos foi comprado por R$ 70 mil, o de transporte teve o preço de R$ 25 mil, sem que houvesse justificativa para esta variação grande.

Além disso, a KTK se encontrava, no momento do contrato, em processo de recuperação judicial e, mesmo assim, não consta nenhuma certidão de regularidade fiscal o que, segundo a CGE, traria “maior segurança jurídica ao processo e evitar questionamentos do controle externo ao gestor’.

Ao G1, a Seplag disse que se respaldou na Lei Federal 13.979, em que “fica dispensada a apresentação de documentação de regularidade fiscal, ou, ainda, o cumprimento de um ou mais requisitos de habilitação”.

‘Alerta de conluio e fraude à licitação’

No segundo processo para aquisição de 300 respiradores, uma das empresas participantes da cotação de preços, a Maq Laser, não tem CNPJ, nem sequer é do ramo da saúde. Com sede em Salvador, o estabelecimento atua na área de impressão e cópias.

Mesmo assim, o governo juntou ao processo de compra um suposto orçamento feito pela empresa, sem data, nem condições de pagamento. O preço do respirador associado à Maq Laser, de R$ 160 mil a unidade, é o mesmo de outra proposta, da empresa Officermaq, muito acima do padronizado pelo Ministério da Saúde.

O valor também foi bem superior ao da empresa que assinou o contrato, a Air Liquid, que foi de pouco mais de R$ 24 mil a unidade.

A CGE constatou, ainda, que a Maq Laser e a Officermaq têm sede em endereços diferentes, mas o mesmo telefone para contato, e consideraram quantidades diferentes em cada orçamento. Enquanto na proposta da Officermaq consta a aquisição de 70 unidades, na da Maq Laser, constam 30.

‘O referido achado demonstra elementos de alerta de conluio entre fornecedores, fraude à licitação, restrição ao caráter competitivo, bem como a oportunidade para o aperfeiçoamento de processos e/ou controles internos”, afirmou a Controladoria.

‘O referido achado demonstra elementos de alerta de conluio entre fornecedores, fraude à licitação, restrição ao caráter competitivo, bem como a oportunidade para o aperfeiçoamento de processos e/ou controles internos”, afirmou a Controladoria.

A Controladoria também identificou que não houve consultas ou pesquisas para verificar a existência de sanções ou penalidades que pudessem impedir os fornecedores de participar de contratação pública.

Sobre a metodologia de pesquisa de preços, a Seplag informou que “foi devidamente fundamentada conforme documentação instrutora do processo de compras e amplamente explicada, com a apresentação de quadro comparativo de preços, critérios adotados para a escolha do fornecedor e explicações técnicas relacionadas ao contexto vivenciado provocado pela pandemia da Covid-19”.

A Secretaria não comentou o fato de uma das fornecedoras, Maq Laser, não ser do ramo de equipamentos hospitalares. Negou que tenha ocorrido conluio e que, mesmo com a proposta da Air Liquide pronta, “propôs negociação de preços com a própria fabricante dos equipamentos, a Phillips, e, após esgotar todas as tentativas de redução, optou pela empresa que ofertou o melhor preço dentro do prazo estipulado de aceitação para recebimento.”

Aquisição de testes

O contrato para compras de testes RT-PCR, que é o indicado para diagnóstico da Covid-19, só foi formalizado pelo Estado em 31 de março do ano passado – o primeiro caso foi confirmado no dia 8. O governo explicou que a aquisição se deu como parte do plano de contingência, já que os testes são fornecidos pelo Ministério da Saúde.

A empresa selecionada foi a Síntese Bitecnologia, que já era fornecedora do Estado. Para o levantamento de preços, a Secretaria de Estado de Saúde informou diferentes necessidades a cada um dos contactados. Segundo o relatório da CGE, foram feitas:

Uma solicitação de orçamento informa a necessidade de 18 milhões de testes

Duas solicitações pedem 750 mil unidades de dois dos itens que compõem o RT-PCR

Uma proposta comercial com indicação de quantitativo equivalente a 150 mil testes, que é da empresa vencedora;

Cinco solicitações de orçamento para “o quantitativo que a empresa tiver”;

Uma solicitação que informa a necessidade de um milhão de testes;

Além de um quadro comparativo de preços que indica a quantidade de 450 mil testes.

Uma solicitação de orçamento informa a necessidade de 18 milhões de testes

Duas solicitações pedem 750 mil unidades de dois dos itens que compõem o RT-PCR

Uma proposta comercial com indicação de quantitativo equivalente a 150 mil testes, que é da empresa vencedora;

Cinco solicitações de orçamento para “o quantitativo que a empresa tiver”;

Uma solicitação que informa a necessidade de um milhão de testes;

Além de um quadro comparativo de preços que indica a quantidade de 450 mil testes.

Para a Controladoria, “a imprecisão do que se necessita adquirir, somada às condições de mercado, interfere tanto na apuração do preço como nas propostas comerciais dos potenciais fornecedores e na estimativa da capacidade de entrega dos mesmos”.

A Seplag disse ao G1 que, na primeira aquisição de insumos pelo Estado, “era complexo precisar o quantitativo de testes que seriam demandados pelo estado. Dessa forma, a estimativa inicial foi realizada de acordo com o número de notificações de casos suspeitos”. Por isso, o valor foi ajustado levando em conta a quantidade de casos descartados e a capacidade para processamento dos testes.

O orçamento escolhido pelo governo, que indicava a quantidade de 150 mil testes, contemplava cinco insumos diferentes, que compõem o kit RT-PCR, ao invés de contemplar o kit completo. Um destes itens, o reagente de extração de RNA, teve uma grande redução entre a demanda levantada pela SES, que era de 600, para a quantidade realmente adquirida, que foi 170. Segundo explicação dada à CGE, este era o volume máximo que a empresa era capaz de ofertar.

Entretanto, segundo a Controladoria, a Secretaria de Estado de Saúde não demonstrou, em documentos, o impacto desta redução para o número total de testes a serem realizados, nem mencionou como evitar que os outros insumos ficassem parados e os testes deixassem de ser realizados.

O quantitativo, segundo o relatório da CGE, permitiria a realização de apenas 42.500 exames, um terço da última quantidade prometida.

Entre as consequências dos equívocos da compra, segundo a CGE, está ‘a contratação de uma solução que poderia ter sido executada em melhores condições, não atendimento da necessidade do órgão e desperdício de recursos públicos’.

Entre as consequências dos equívocos da compra, segundo a CGE, está ‘a contratação de uma solução que poderia ter sido executada em melhores condições, não atendimento da necessidade do órgão e desperdício de recursos públicos’.

Outras falhas foram constatadas ainda no processo de orçamento. Segundo a CGE, não há planilhas com a composição de todos os custos unitários ou provas de que se buscou o melhor custo benefício. Também não foram consultados os registros dos fornecedores na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). O governo disse, no entanto, que grande parte dos insumos é utilizado para pesquisa e afirmou que, para estes insumos, o controle de cadastro de registros “não se aplica”.

Depois da compra, o governo não tinha mecanismos de controle que garantissem a compatibilidade da quantidade recebida em relação ao valor pago.

Em junho de 2020, o G1 mostrou que, mesmo diante do primeiro pico de casos da pandemia, Minas Gerais era o estado com pior testagem para Covid-19.

Em relação a compra de itens separadamente ao invés do kit PCR completo, o governo disse que “ao final da orçamentação, obteve-se diversas respostas com negativa de fornecimento dos fornecedores e outras cotações com disponibilidade para atendimento, conforme instrução presente no processo de compras, resultando na elaboração de um mapa de preços. No mapa, há uma tabela para cada item solicitado, sendo organizada por fornecedor, marca/modelo, prazo de entrega, forma de pagamento, valor unitário e valor total. Ao final da montagem deste mapa, restou claro que, para todos os itens, a empresa Síntese Biotecnologia LTDA possuía o menor preço unitário.”

Relação entre as empresas

Entre os orçamentos levantados para aquisição dos testes, três deles – Sintese, Molecular e Biocell – apresentaram o mesmo padrão de apresentação gráfica; dois fornecedores – Molecular e Biocell têm textos e validade da proposta idênticas, além de indicarem o mesmo endereço. As propostas foram entregues na mesma data, 11 de abril de 2020, feriado de Páscoa.

A CGE também identificou relação entre os sócios das empresas. Os donos da Molecular e Biocell têm vínculo familiar e os proprietários da Síntese, vencedora da proposta, tinham vínculos profissionais com um dos sócios da Molecular.

Além disso, a fornecedora disponibilizou produto de uma outra empresa, Bioclin Quibasa, que também chegou a encaminhar proposta comercial na fase de pesquisa de preços, mas com valor muito acima do apresentado pela vencedora.

Sobre a relação entre as empresas consultadas, o governo disse que “a contratação em questão não é um procedimento licitatório, mas sim uma dispensa, na qual a pesquisa de preços não busca a construção de um preço de referência, mas sim o menor preço oferecido pelo mercado naquele momento, naquelas condições e, por isso, as cotações buscavam empresas disponíveis no mercado, com o único intuito de encontrar aquela que tivesse o menor preço e os produtos tecnicamente aprovados pela SES”.

Veja o que mais disse a Secretaria de Planejamento e Gestão (Seplag):

“A Secretaria de Planejamento e Gestão (Seplag) informa que a compra dos 1.047 respiradores adquiridos ao menor preço médio do país foi acompanhada pelo Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) e pela Justiça Federal, que, inclusive, foi a responsável pela liberação financeira dos valores.

Em razão da pandemia e da escassez de equipamentos e insumos relacionados à saúde, houve urgência nos processos de aquisição, para evitar que faltassem leitos e atendimento à população. Essa compra permitiu que, hoje, Minas tenha mais de 4.400 leitos de UTI, enquanto no início da pandemia eram cerca de 2 mil leitos.

O cenário levou à edição de normas específicas para o enfrentamento, com destaque para a Lei 13.979/2020, que flexibilizou regras comumente verificadas no processo regular de contratações públicas.

Os questionamentos apontados nesta demanda foram devidamente respondidos à Controladoria Geral do Estado (CGE) e as recomendações foram acatadas para observação em processos futuros. As implementações constam em planos de ações específicos que estão sendo igualmente acompanhados pela CGE.”

Fonte: G1

Veja também: https://panoramafarmaceutico.com.br/2021/04/15/covid-ministerio-da-saude-e-india-discutem-producao-de-vacinas-e-ifa/

Notícias Relacionadas