Suspender vacina da AstraZeneca na Europa atrapalhou combate à pandemia, diz brasileira consultora da OMS
Na quinta-feira (18), países europeus anunciaram que iriam retomar a vacinação com o imunizante da AstraZeneca após a Agência Europeia de Medicamentos (EMA) afirmar que seu comitê técnico avaliou que a vacina é “segura e eficaz” e que os benefícios superam os riscos.
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Alemanha, Itália e França já recomeçam a usar o fármaco nesta sexta-feira (19). A suspensão da vacinação ocorreu em 13 países europeus após serem registrados casos de trombose e embolia entre vacinados pelo imunizante AstraZeneca/Oxford.
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Apesar de terem voltado atrás na suspensão, esse tipo de medida tem impacto negativo na confiança na imunização, diz Cristiana Toscano, infectologista, epidemiologista e professora da UFG. Segundo ela, membro do comitê para vacinas Covid da OMS e da Fiocruz, é preciso respeitar que ‘cada país tem seu limiar’, mas ações ‘meio atravancadas atrapalham, sim’. Leia principais trechos:
Como a senhora vê o anúncio da EMA e a recepção por parte dos países europeus?
Esse novo posicionamento da EMA foi contundente. Garantiu a segurança e eficácia, mas vai ter um aviso como um alerta a profissionais de saúde para ficarem atentos a alguns tipos de eventos em particular. Esse processo é importante: são os estudos de fase 4, feitos depois de implementar um fármaco em larga escala para monitorar e seguir os sinais de alerta. O monitoramento deve ser muito rigoroso. Nesse caso o que chamou atenção foram eventos tromboembólicos, tromboses ou embolias, e foi feita uma investigação para ver possível relação com a vacina.
Foram administradas na Europa e Reino Unido 20 milhões de doses até 16 de março e a taxa de ocorrência de eventos tromboembólicos em geral foi menor do que a observada na população em geral. Deu tranquilidade. Mas tem um tipo de evento muito raro, a trombose de seio venoso cerebral, que teve um número maior do que o esperado. Isso ainda está em investigação e por isso essa cautela. Mesmo com esse evento particular, a conclusão reforça a importância da vacina em relação à diminuição de óbitos causados pela Covid-19.
Remédios têm na bula um alerta sobre efeitos adversos. Esse risco não é igual entre vacinas?
Diferentemente de um medicamento, você dá a vacina para a população saudável, para prevenir uma doença, então o risco aceito pela sociedade para vacinas é muito menor do que para medicamentos. Uma pessoa doente vai aceitar um risco maior. E como as vacinas são administradas num quantitativo muito grande há uma preocupação. Por outro lado, as vacinas são as únicas intervenções que fazem testes com 50, 60 mil pessoas, um grupo muito maior. Então a gente registra já sabendo que em um grupo grande de pessoas não houve efeitos graves importantes. Mas efeitos raríssimos só são possíveis de identificar com a fase 4.
A senhora teme que todo esse imbróglio faça com que pessoas, não só na Europa mas também no Brasil, temam se vacinar?
Essas medidas meio atravancadas atrapalham, sim. A França foi um dos países europeus que decidiu não administrar a AstraZeneca para maiores de 60 anos, por precaução, diferentemente do que a EMA e a OMS diziam. Depois, vieram mais estudos e o país mudou de ideia, mas surgiu hesitação entre os franceses em função desse suspende, volta, depois suspende de novo. A população não entende e fica preocupada.
É importante ressaltar que as suspensões foram temporárias, nenhuma definitiva. Na minha opinião, a medida foi prematura. Mas cada país tem seu limiar para fazer uma suspensão por precaução, não dá para dizer se foi correto ou não. Existem critérios locais.
Existem critérios locais, mas a decisão de um país acaba afetando outros.
É a questão do efeito manada. Quando uma pessoa, uma instituição ou país decide, mesmo que por cautela e de forma temporária, suspender a vacinação, um grupo enorme acaba seguindo. Foi um pouco o que aconteceu porque alguns países que pararam tinham um caso, Não justificava parar.
Isso pode afetar a vacinação no Brasil?
A Anvisa foi clara sobre a manutenção da vacinação e na maioria dos outros países do mundo também. Aqui, 4 milhões de doses foram administradas e não temos nenhum desses eventos relatados. Por outro lado, temos 2 mil óbitos por dia por Covid. É fundamental reforçar a importância e os benefícios da vacina até pelo que estamos vendo: em vários países já se sabe que houve redução de morte nos grupos vacinados e o mesmo está acontecendo no Brasil, em menos de um mês.
Fonte: Yahoo! Finanças