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Conheça a história da maior plantação legal de cannabis medicinal do Brasil

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Com o projeto de lei 399/15, o Brasil discute a legalização do cultivo da Cannabis sativa para fins medicinais, científicos e industriais em todo o país. A próxima etapa para a potencial autorização é uma votação aberta, no plenário da Câmara, onde cada deputado deverá decidir por apoiar (ou não) a criação da lei. No entanto, liminares judiciais já foram concedidas para o plantio nacional da erva, desde que se justifique a necessidade. Este é o caso da maior plantação de cannabis legal do Brasil, localizada na capital da Paraíba, em João Pessoa.

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Responsável pela plantação histórica e por mais de 13 mil pés da planta, a associação sem fins lucrativos Abrace Esperança cultiva a cannabis, de maneira legalizada, desde o ano 2017. Naquele ano, a entidade recebeu a primeira autorização da Justiça brasileira para cultivar e fornecer derivados da planta aos seus associados em forma de óleos e pomadas.

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Para entender a história do plantio da cannabis, as questões médicas envolvendo o produto e os potenciais benefícios que o tratamento trouxe para os usuários, o Techdoxx conversou com especialistas e pacientes, além do fundador e diretor-executivo da Abrace, Cassiano Gomes.

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Como surgiu a Abrace, maior plantação de cannabis medicinal no Brasil

Inicialmente, o plantio de cannabis não estava nos planos do fundador e diretor-executivo da Abrace, Cassiano Gomes, mas nasceu da necessidade de conseguir tratamento para uma familiar com câncer, mais especificamente sua mãe. Em 2014, Gomes importava o óleo de cannabis, mas começaram a surgir dificuldades para a importação, movidas principalmente pela alta do dólar naquele ano. Em paralelo, um grupo de mães que usavam o produto para o tratamento de seus filhos também passou a enfrentar os mesmos desafios.

‘Eu importava e algumas mães já estavam importando. Então, vi que realmente não fazia mais sentido, porque o preço praticamente tinha dobrado no ano de 2015’, conta Gomes. Naquele período, o fundador da Abrace tinha alguma noção de como começar a produção do óleo de cannabis e entendia o potencial medicinal do produto, já que observou, de perto, a melhora da mãe.

Foi justamente esta experiência positiva que o fez iniciar a produção de forma artesanal, mesmo sem licença das autoridades brasileiras. ‘Passamos um ano [de 2016] praticamente ilegal, plantando e produzindo o óleo artesanalmente, sem nenhuma garantia de que aquilo ali iria continuar’, comenta.

‘Na época, me baseei no princípio jurídico da excludente de licitude. Era para salvar uma vida. Tive o cuidado de levantar a prova de todos os 165 autores [pacientes] do processo que ajuizamos em 2017, com o antes e o de depois do tratamento’, explica o fundador. Hoje, 22 mil famílias são apoiadas pelo projeto e tratam seus familiares com algum dos derivados da planta, agora, autorizados. Entre as principais enfermidades atendidas pela associação, estão: autismo; epilepsia; alzheimer; dores crônicas; e neuropatias.

Como a cannabis é cultivada?

No caso da associação, todas as etapas da produção do óleo de cannabis – seja com maior concentração de canabidiol (CBD) ou de tetrahidrocanabinol (THC) – são feitas por seus membros, com o apoio de uma plataforma de gestão e de rastreabilidade e de forma descentralizada. Por exemplo, o cultivo é feito em um local, enquanto a produção do medicamento é realizada em outro.

Segundo Gomes, todos os processos envolvendo o óleo de cannabis são eletrônicos, auditáveis e têm validação. ‘As etapas de processamento iniciam com o cultivo, feito através de clones ou de sementes. A planta, a partir de quando nasce e completa uma semana, recebe uma etiqueta, que é como se fosse uma certidão de nascimento que caminhará junto com ela em todo o processo de crescimento, floração e colheita’, explica.

Após a colheita, o produto vai para a secagem e depois é transferido para a área de extração de seus componentes. Em seguida, o extrato é enviado para o laboratório da associação, onde ocorrerão as diluições conforme as fórmulas. Com a finalização do produto, ele é enviado diretamente para os associados ou vai para o dispensário que a entidade mantém.

Existe um longo percurso entre o cultivo da cannabis medicinal e entrega dos óleos para os associados (Imagem: Reprodução/César Matos/ABRACE)

Desafios desse novo mercado

Embora o cultivo da cannabis possa parecer similar com o de outros gêneros agrícolas, há uma série de especificidades, como o manual de boas práticas da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Inclusive, no processo de adequação a essas normas, alguns produtos da associação deverão ser descontinuados, como uma pomada. Atualmente, Gomes calcula que o custo para registrar um medicamento à base de cannabis, no Brasil, fique em torno de 460 mil reais.

Além disso, são desafios para o cultivo da cannabis no Brasil: a falta de tecnologia; ausência de mão-de-obra especializada; e falta de uma estrutura de segurança legal. ‘O cultivo, hoje, é um protótipo que está sendo realizado pela Abrace. Tudo aqui é o primeiro ou o maior. Temos que investir em segurança, em tecnologia de rastreabilidade, profissionalizar os profissionais que não tinham experiência. Ainda estamos sujeitos a alguma decisão judicial que possa nos derrubar’, detalha Gomes.

Novas perspectivas com a PL 399/15

Mesmo com essas barreiras, a associação comercializa os produtos com valores menores que o do mercado. Por exemplo, o custo de um produto na Abrace varia de 79 a 650 reais, sendo este último o mais concentrado. Isso considerando que a pessoa seja associada. Do outro lado, nas farmácias, os valores oscilam entre 1,8 mil a 3 mil reais, por causa da matéria-prima importada.

No entanto, o PL 399/15 pode mudar esse cenário para a inciativa privada, já que trará maior concorrência para o mercado, mas, principalmente, dará segurança jurídica para todos os envolvidos, inclusive as associações de cultivo.

Quanto à ida do projeto de lei para o plenário da Câmara dos deputados, Gomes enxerga o cenário com positividade. ‘Acredito que vai ajudar, porque é um colegiado maior e existe uma maioria que apoia o uso medicinal da cannabis. Quanto maior a casa, mais apoio devemos ter’, especula.

Com o PL 399/15 e toda a discussão já iniciada, o médico e clínico geral Pedro Pulcherio Filho entende que o tratamento deve alcançar um maior número de pessoas. Para a saúde pública brasileira, o uso regulamentado da cannabis medicinal poderá trazer ‘melhor qualidade de vida para a população que, hoje, depende de medicamentos que, muitas vezes, são caros e que a longo prazo trazem mais malefícios do que benefícios’, afirma o médico.

Quem usa os óleos?

‘Temos comprovação científica dos benefícios do uso da cannabis medicinal em casos de epilepsia, dor crônica, fibromialgia, Alzheimer, Parkinson, esclerose múltipla, glaucoma, autismo, doenças reumatológicas e inflamatórias intestinais, depressão, ansiedade e distúrbios do sono’, explica Pulcherio Filho. Além disso, o especialista comenta que já existem estudos científicos que demostram os benefícios da cannabis medicinal no tratamento de alguns tipos de câncer e, principalmente, no tratamento de efeitos colaterais causados pela quimioterapia.

‘Como clínico geral, tive a oportunidade de atender pacientes com diversos tipos de doenças. De todos os pacientes que tratei até o agora, foram raros os momentos que não obtive resultados satisfatórios com o uso da cannabis medicinal’, defende o médico. Quanto às medidas e a forma de uso, Pulcherio Filho explica que não existe um padrão de dose do óleo estabelecida para cada doença e os tratamentos são feitos de forma individualiza, especialmente em relação às concentrações dos canabinoides.

Experiência dos pacientes

Enfrentando o Alzheimer, doenças reumatológicas e, há anos, lutando contra a depressão, Paulinha é uma das pacientes que realizam o tratamento com o óleo de cannabis, desde o final de 2019. ‘É preciso lidar contra o estigma, o preconceito envolvendo a cannabis medicinal. Principalmente para as faixas etárias próximas da minha mãe, ainda há um preconceito muito grande e fazem o link da cannabis com drogas’, conta Rebeca Guimarães, filha da paciente aposentada.

Sobre os efeitos dos dois anos de uso da cannabis medicinal, Rebeca explica que ‘o comprometimento que ela já tinha quando começou o tratamento [por causa do Alzheimer], nenhuma medicação conseguiria reverter. O que acredito que estamos conseguindo é estabilizar o quadro, como uma contenção da doença’. Inclusive, a filha mantém uma página nas redes sociais ( @nomundodepaulinha ), divulgando a rotina da mãe e as conquistas diárias dela.

Outro associado da Abrace é Bernardo, filho de Cíntia. O menino é diagnosticado com paralisia cerebral grave e epilepsia refratária. Segundo a mãe, antes de iniciar o tratamento com óleo de cannabis, a criança convulsionava todos os dias – mais de 100 vezes por dia -, sendo que a primeira convulsão aconteceu aos dois meses de vida e, desde então, o quadro veio se agravando.

‘Tomava quatro medicamentos em doses altíssimas e já não fazia mais efeito’, conta Cíntia. Desde dezembro de 2015, Bernardo é tratado com óleo e começou a apresentar melhora da sua condição. ‘Diminuiu as crises. Nunca pensei que meu filho fosse falar novamente e, hoje, ele fala, olha para a gente, acompanha com os olhos e dá gargalhadas’, completa a mãe.

Fonte: TECHDOXX

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