Com a pandemia, aumentou o número de pessoas que recorrem a medicamentos para dormir. No ano passado, só entre os meses de abril e maio, a pesquisa pela palavra “insônia” aumentou 130% no Google. No entanto, estes medicamentos podem causar dependência química ou mesmo psicológica, por isso devem ser consumidos apenas com prescrição médica.
De acordo com o psiquiatra Márcio Ueda, do Hospital Universitário de Jundiaí, a pandemia trouxe o aumento de 10% a 15% nos casos de insônia o que tem refletido no aumento da procura por medicamentos que induzam o sono.
“A rotina das pessoas mudou completamente. Home office, crianças em casa, trabalhar até mais tarde, mais tempo na internet, tudo isso influencia. Quebrou o que a gente chama de higiene do sono e muitas pessoas recorrem à medicação”, explica.
Marcelo Buzanelli, delegado regional da Seccional de Jundiaí do Conselho Regional de Farmácia do Estado de São Paulo (CRF-SP), também sentiu esse aumento no consumo de produtos indutores do sono. “Isso se dá devido aos fatores externos da pandemia como perda de emprego, redução de renda familiar. Tudo isso gera ansiedade, distúrbio de sono e todos esses males.”
Dependência
Foi o caso da professora de educação física Raquel de Marchi Godoy, 31 anos. “Eu tinha insônia e ansiedade. E o fato de não dormir me deixava ainda mais ansiosa, porque eu sabia que se não descansasse não conseguiria cuidar direito dos meus filhos, que têm 4 e 8 anos. Cheguei a tomar remédio para conseguir dormir durante um ano e, se não tomasse, não dormia”, relata.
Ueda explica que a dependência pode ser uma das consequências do uso de medicação. “A pessoa quer uma solução rápida e recorre à medicação, o que não recupera a arquitetura do sono”, diz.
“Há quem recorra aos calmantes, que geram mais dependência e não proporcionam um sono reparador, seria a classe de remédios como o Clonazepan, e os indutores de sono mesmo, como o Zolpidem, que causam menos dependência física, mas também podem levar à dependência psicológica.”
Recomeço
Depender física e mentalmente de um remédio era algo que incomodava Raquel. Naquela época era impossível cogitar dormir sem a medicação, por isso ela começou a buscar outras soluções para tratar tanto a ansiedade quanto a insônia. “Comecei a buscar formas mais naturais para isso e acabei conhecendo a auriculoterapia e a ventosaterapia.”
Seis meses depois, a auriculoterapia ajudou a manter a ansiedade sob controle e a ventosaterapia atuou na liberação de toxinas para melhorar a qualidade do sono. “Não tomo mais medicação, apenas utilizo essas técnicas naturais uma vez por semana. Gostei tanto que fiz os cursos e me tornei terapeuta.”
Fitoterápicos e remédios homeopáticos também são boas opções para começar a limpar o organismo do excesso de indutores de sono ou calmantes.
“Ao invés de artificializar a indução do sono, você deve mudar hábitos como desligar os eletrônicos antes de dormir, jantar mais cedo, praticar atividade física 3 horas antes de dormir, porque é o tempo para liberar a endorfina, que ajuda no sono”, sugere. “Se o problema for ansiedade, escreve em um papel o que precisa fazer amanhã para ir dormir de cabeça tranquila.”
Como dormir melhor
A luz dos dispositivos móveis como tablet, computador, celular ativa substâncias no cérebro que deixam a pessoa mais ativa, mais ligada, o que é um dos fatores que mais influencia o sono negativamente.
“O cérebro fica hiperativado. Um exemplo são pessoas que veem muito seriado ou jogo de futebol. A pessoa fica naquele estado emocional e depois não consegue dormir”, diz Ueda. Outra dica é não tomar substâncias que ajudam a despertar, como o café, refrigerante e álcool.
“É começar com uma adaptação de higiene do sono, tomar café ou refrigerante apenas até umas 14h, 15h. Evitar comida condimentada à noite.”
Automedicação
Uma pesquisa realizada pelo Conselho Federal de Farmácia (CFF), por meio do Instituto Datafolha, constatou que a automedicação é um hábito comum a 77% dos brasileiros que fizeram uso de medicamentos nos últimos seis meses anteriores ao estudo, feito em 2019.
Essa automedicação também é uma preocupação tanto para os médicos quanto para os farmacêuticos. “Todo medicamento tem os efeitos benéficos e os efeitos colaterais e adversos. Por isso o que nem sempre o que é bom para minha mãe é bom para mim”, orienta Buzanelli.
O psiquiatra Márcio Ueda reforça a preocupação sobre a facilidade do acesso a medicações, mesmo as controladas. “A facilidade do acesso as medicações fez aumentar o consumo e isso é um dos problemas.
Hoje as pessoas nem procuram psiquiatra, às vezes procuram o clínico geral, que recomenda um calmante, e às vezes tomam algo de um parente ou amigo por contra própria. É comum pacientes chegarem no consultório com distúrbio depois de terem experimentado remédios por contra própria.”
Fonte: Jornal de Jundiaí – SP