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Base de dados da vacinação tem erros que dificultam monitoramento

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Além de doses para todas as pessoas, a campanha de vacinação contra a Covid-19 também necessita de outro insumo para ser eficaz: informações de qualidade. O problema é que a base de dados do Ministério da Saúde sobre a campanha de imunização contém diversos erros, o que pode prejudicar o esforço de saúde pública e afetar o rastreio de efeitos adversos, segundo especialistas.

O Metrópoles identificou problemas de diversos tipos. Alguns podem ser descobertos ao analisar a própria base de dados. É o caso de pessoas jovens registradas como pertencentes a grupos prioritários de faixas etárias mais elevadas. Em outros, a situação é potencialmente mais grave, e a própria informação inserida no sistema pode estar errada.

Em 24 de maio o Brasil.Io, iniciativa que facilita o acesso a dados públicos, listou problemas que encontrou no sistema. Entre eles está, por exemplo, a informação de que 659.878 pessoas possuem apenas a segunda dose registrada – nada sobre a primeira (como datas de aplicação ou laboratório da vacina). Além disso, prossegue, ‘existem 170.129 registros de doses aplicadas em indivíduos classificados como grupo prioritário ‘Faixa Etária’ na coluna, mas que referem-se a pessoas com menos de 60 anos e que, portanto, não fariam parte do citado grupo prioritário (idosos)’.

Professor do Instituto de Estudos em Saúde Coletiva da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Guilherme Werneck explica que essas inconsistências acabam por deturpar a realidade e, assim, prejudicar a tomada de decisões de gestores públicos, uma vez que é necessário, em algumas ocasiões, ter de definir novos rumos rapidamente.

‘Sobre essas pessoas que possuem apenas a segunda dose registrada: isso aconteceu por que os dados da primeira dose não entraram? Ou será que registrou como segunda, mas era a primeira? Então, o paciente está imunizado ou não está imunizado?’, exemplifica.

‘Esses erros, da maneira que estão sendo apresentados, e as dúvidas que são geradas em relação a isso, acabam atrasando mais ainda a vacinação, deixando mais gente vulnerável e, portanto, podendo resultar em mortes que poderiam ser evitadas’, complementa, ao citar outros exemplos na base de dados do ministério, como informações duplicadas e imprecisões em relação à raça e à cor dos imunizados.

Vacinas perdidas

Parte desses problemas vem do fato de que muitas das informações são inseridas dígito a dígito pela pessoa responsável. Nesses casos, o melhor é que houvesse categorias selecionáveis, minimizando divergências em grafias. No início de junho, por exemplo, havia 172 formas diferentes de identificar o fabricante da vacina, sendo que há apenas três imunizantes sendo usados no Brasil.

Supondo que todos esses erros fossem corrigidos, contudo, mesmo assim a base de dados ainda estaria longe de perfeita. Isso porque há casos de informações erradas inseridas no sistema que, para serem corrigidas, precisam de alguma forma analógica de verificação.

Um desses casos, por exemplo, envolve os lotes de vacinas que já venceram. Se a base estivesse correta, bastaria ver quantos imunizantes desse lote não foram aplicados para saber quanto foi perdido. O Metrópoles tentou fazer isso no fim de maio, analisando quatro lotes da vacina da AstraZeneca que venceram em abril. A perda teórica seria de quase 25 mil doses.

Teórica porque, ao entrar em contato com as secretarias de Saúde estaduais para entender o que poderia ter acontecido, muitas respostas diziam que todas as doses tinham sido aplicadas e que não houve descarte. Logo, o problema estava na base de dados, mais precisamente ao informar qual lote tinha sido aplicado na pessoa.

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Vacinação em massa em Botucatu ?

Vacinação em massa em Botucatu ?

Vacinação de pessoas em situação de rua no DF ? 1 2 3

O epidemiologista e chefe da sala de situação da Universidade de Brasília (UnB) Mauro Sanchez aponta a situação como preocupante. ‘A responsabilidade de rastrear as pessoas caso elas apareçam com evento adverso é da Anvisa. E ela tem de receber a informação para poder rastrear o lote. Se tem dado faltante, é preocupante, claro’, disse.

Vacinas vencidas

Doutor em saúde coletiva e membro da Comissão de Política, Planejamento e Gestão da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), o professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFGRS) Dário Pasche descreve a situação como ‘lamentável’.

‘Ocorre também que o processo de preenchimento é moroso, pois muitos municípios digitam os dados (um a um, nos drive-thrus, por exemplo) e há relatos de pilhas e pilhas de ‘folhas’ com informações que não entraram no sistema; ou seja, além da qualidade, como erros de digitação, há o atraso da entrada da informação no sistema. Isso gera, por exemplo, o erro que foi apontado de pessoas só com a segunda dose, pois a primeira teria sido feita, mas ainda não registrada’, analisa.

‘O PNI [Programa Nacional de Imunização] é um programa, logo segue racionalidade programática: calendário, imunizantes, doses, intervalos e público bem definido. Vacinamos da mesma forma, por exemplo, crianças de Manaus e de Santa Catarina. O cenário criado pela negligência diante da aquisição de vacinas, como a incerteza de ter ou não imunizantes, doses e prazos, incluiu muitas variáveis (complexas) na lógica do PNI, que se desarticulou’, complementa o especialista.

O professor cita como um outro exemplo os dados sobre vacinas vencidas. As prefeituras de ao menos 1.532 cidades brasileiras continuaram a aplicar essas doses, mesmo depois de o problema ter sido revelado pelo Metrópoles, em abril deste ano.

Levantamento do jornal Folha de S. Paulo, repetindo o método utilizado na primeira investigação, apontou 25.935 casos de doses supostamente vencidas que foram aplicadas. No fim do quarto mês do ano, eram 1,2 mil ocorrências. Os problemas dizem respeito a oito lotes de vacinas da AstraZeneca, que expiraram entre 29 de março e 4 de junho.

A campeã em aplicações de vacinas vencidas teria sido a cidade paranaense de Maringá, com 3.563 casos, seguida por Belém (PA), com 2.673 ocorrências, e São Paulo (SP), com 996 situações. As prefeituras, entretanto, alegam que não houve aplicação de doses fora da validade, mas erro no sistema.

O prefeito de Maringá (PR), Ulisses Maia (PSD), afirmou, por exemplo, na sexta-feira (2/7) que não foram aplicadas doses vencidas da vacina contra o coronavírus na cidade. O que ocorreu, segundo ele, foi erro do Sistema Único de Saúde (SUS).

‘O lançamento no Sistema Conect SUS está diferente do dia da aplicação da dose. Isso porque, no começo da vacinação, a transferência de dados demorava a chegar no Ministério da Saúde, levando até dois meses. Portanto, os lotes elencados são do início da vacinação e foram aplicados antes da data do vencimento’, afirmou Ulisses Maia, em uma rede social.

Guilherme Werneck, da UFRJ, explana o problema. ‘Isso é uma coisa grave. Mas essa informação é confiável ou não é confiável? Ou seja, potencialmente pode se ter um problema, se realmente estiver dando vacina atrasada. Se não, a pessoa, ao tomar a vacina, vai querer ver se está dentro da validade, vai desconfiar? logo, vai tornar o processo de vacinação mais lento’, avalia professor.

O que fazer?

Em nota, a Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm) afirma que quem tomou o imunizante fora da data de validade não precisa se preocupar com efeitos colaterais ou problemas à saúde, mas deve voltar ao posto de saúde para receber a vacina novamente.

Já a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) informou que ‘atua na avaliação da qualidade, segurança e eficácia das vacinas e das condições de fabricação das empresas envolvidas na produção tanto do insumo farmacêutico ativo quanto do produto acabado’. A nota chama a atenção para o ponto: ‘Vacinas com prazo de validade expirado não têm garantias de eficácia e segurança’.

Fonte: Metrópoles

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