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Bons hábitos evitam a incidência do Alzheimer em até 40%, diz estudo

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Sem cura nem tratamento que ataque suas causas, a doença de Alzheimer deve superar os 152 milhões de casos em menos de três décadas. Enquanto a ciência não decifra os mecanismos que levam a essa degeneração gradativa do cérebro, porém, é possível tentar reduzir os riscos com ajustes no estilo de vida.

Novas pesquisas reforçam o papel de fatores como tabagismo e isolamento social na probabilidade aumentada de se desenvolver o mal, sugerindo que hábitos saudáveis ajudariam a evitar até 40% da incidência da doença.

Um dos documentos mais importantes para nortear as diretrizes preventivas foi publicado na revista médica The Lancet e elaborado por uma comissão de cientistas de várias partes do mundo.

O texto, que cita 315 artigos sobre Alzheimer, destaca os fatores de risco modificáveis, que já eram conhecidos, e acrescenta outros (veja quadro), além de identificar quais os mais impactantes dependendo da fase da vida.

A expectativa dos autores é de que políticas públicas e decisões individuais possam evitar ou, ao menos, retardar parte da incidência, já que o principal fator de risco de demências é imutável: o avanço da idade.

“Aos 60 anos, 2% das pessoas têm demência, e essa prevalência dobra a cada sete anos. De tal maneira que, aos 90, metade da população nessa idade terá demência”, diz o geriatra Otávio Castello, fundador e ex-presidente da Associação Brasileira de Alzheimer (Abraz), regional DF.

“A idade é um fator de risco não modificável. Então, temos de nos focar naqueles em que é possível intervir”, diz.

Segundo o artigo da The Lancet, os riscos modificáveis têm pesos diferentes de acordo com o momento da vida, destaca o médico. “É interessante como esse artigo perverte muitas coisas que as pessoas acreditam. Por exemplo, na idade média, o principal fator de risco modificável é a surdez.

Outro extremamente importante é a depressão. Tanto a surdez quanto a depressão não tratadas vão desativando áreas do cérebro, estimulando uma perda de neurônios e de conexões entre eles”, diz Castello.

Multifatorial

Doença complexa, o Alzheimer é, como muitas outras, consequência de uma combinação de fatores. Do ponto de vista fisiopatológico, ele se caracteriza por alterações cerebrais provocadas por acúmulo de uma proteína, a beta-amiloide, que, por sua vez, induz um processo de destruição de estruturas que formam os neurônios, causando os chamados emaranhados neurofibrilares. Há, pelo menos, 40 locais do genoma associados à enfermidade e, nos casos de demência precoce, a hereditariedade também desempenha um papel.

A influência dos fatores modificáveis vem sendo estudada com atenção nas últimas décadas, especialmente por estudos epidemiológicos, que comparam a incidência da doença entre parcelas da população, com base em informações sobre alimentação, sedentarismo, consumo de álcool etc.

Esse tipo de pesquisa não é capaz de encontrar uma associação direta de causa e efeito — por exemplo, não prova que o cigarro de alguma forma altera a estrutura dos neurônios. Porém, fornece dados estatísticos que, combinados a conhecimentos científicos prévios, oferecem pistas sobre a relação de um fator com o desenvolvimento da enfermidade.

“A gente sabe que diversas coisas afetam o cérebro. Pressão alta, além de provocar alterações circulatórias, pode funcionar como um gatilho dos fenômenos envolvidos no Alzheimer, disparando os mecanismos da doença que destroem o tecido cerebral”, diz Otávio Castello.

“Estilos de vida saudáveis podem proteger a saúde do cérebro ao melhorar o metabolismo da glicose e dos lipídios, reduzindo a inflamação e o estresse fisiológico”, completa a epidemiologista Danxia Yu, principal autora de um artigo publicado recentemente na revista Neurology.

Apresentado no congresso Nutrition 2022, da Sociedade Norte-Americana de Nutrição, o estudo de Danxia Yu, com dados de 17.309 voluntários acompanhados por quatro anos, reforçou que tabagismo, uso de álcool, inatividade física, poucas horas de sono e má qualidade da dieta estavam, individualmente, associados a um risco entre 11% e 25% mais elevado de se desenvolver essa e outras demências. Combinados, eles aumentaram em 36% a probabilidade de neurodegeneração. Os resultados não variaram idependentemente de sexo, etnia, nível de educação, renda e doenças crônicas preexistentes.

Atenção à saúde mental

“Sabemos que a doença de Alzheimer é a principal demência que se tem no mundo, e que ela traz muita morbidade, ou seja, adoecimento, e muita mortalidade, com impacto na vida dos pacientes, cuidadores, familiares e nos gastos de saúde pública. Hoje em dia, na psiquiatria, estudamos bastante a relação de alterações de humor com os aspectos cognitivos.

Essas alterações, como a depressão, podem mesmo antecipar o declínio da cognição: por exemplo, um declínio que ocorreria aos 80 anos pode vir uma década antes.

E também dar celeridade ao processo demencial. Outras vezes, a pessoa pode ir deprimindo por se perceber disfuncional, não só em relação a esquecimentos, mas não dando conta mais de executar algumas funções cognitivas que anteriormente fazia com tranquilidade, como ir ao banco, gerenciar as questões financeiras, dirigir…

Então, assim como peso, tabagismo, abuso de álcool e diabetes, as alterações de humor têm uma relação com o risco de Alzheimer.”

Alisson Marques, psiquiatra do Instituto Meraki e médico do Núcleo de Saúde Mental da Secretaria de Saúde do DF

Combinação de doenças preocupa

Um outro estudo, publicado na revista Alzheimer´s & Dementia, destacou o peso de diabetes tipo 2 e doenças cardiovasculares no desenvolvimento da demência.

Segundo os autores, do Instituto Karolinska, na Suécia, a presença de mais de uma enfermidade cardiometabólica, como isquemia cardíaca e obesidade, acelera a velocidade do declínio cognitivo e dobra o risco de comprometimento neurodegenerativo.

“Poucos estudos examinaram como o risco de demência é afetado por ter mais de uma dessas doenças simultaneamente. Então, é isso que queríamos examinar em nosso estudo”, diz Abigail Dove, doutoranda do Centro de Pesquisa em Envelhecimento do instituto e principal autora.

A pesquisa incluiu 2,5 mil pessoas saudáveis, sem demência, com mais de 60 anos. No início, os cientistas estimaram a incidência de doenças cardiometabólicas por meio de prontuários e avaliação clínica. Os participantes foram, então, acompanhados por 12 anos com exames médicos e testes para monitorar a manutenção ou a degeneração das habilidades cognitivas.

“Em nosso estudo, as combinações de diabetes/doença cardíaca e diabetes/doença cardíaca/derrame foram as mais prejudiciais à função cognitiva”, diz Dove. No entanto, pessoas que tiveram apenas uma enfermidade do tipo não apresentaram um risco significativamente maior de declínio cognitivo. “Então, é possível que a demência possa ser evitada prevenindo o desenvolvimento de uma segunda doença.”

O endocrinologista João Lindolfo Cunha Borges, membro da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (Sbem), destaca a importância de se controlar os fatores de risco das doenças cardiometabólicas como prevenção das demências. “É sabido que doenças crônicas mal controladas podem desencadear o Alzheimer.

Ter diabetes não é um problema. Ter diabetes descontrolada é um problema”, ressalta. Cuidar do peso também é essencial, ensina o médico: “Nós já temos mais de 60% da população brasileira com sobrepeso e obesidade. Não existe obeso saudável. Obesidade leva a hipertensão, diabetes, infarto, cânceres, entre outras morbidades. Com certeza levará a Alzheimer”, destaca.

Para o geriatra Otávio Castello, os estudos sobre a associação de fatores de risco ambientais e demências trazem uma importante lição. “Se a pessoa não tiver obesidade, não fumar, beber álcool com moderação e controlar a pressão, isso vai diminuir o risco de ela ter demência.

Não adianta nada fazer palavras cruzadas e exercícios de estímulo da memória, usar ábaco etc. se não controlar pressão alta e diabetes, não fizer atividade física, não tratar surdez, entre outros” (PO).

Fonte: Correio Braziliense

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