As distribuidoras da ABRADIMEX, associação que representa 15 empresas com foco em medicamentos de especialidades, cobram maior flexibilidade da indústria farmacêutica na concessão de prazos e descontos. Ao atuar como um hub financeiro de clínicas, hospitais e farmácias de especialidades e com a explosão na demanda, o setor vê cada vez mais comprometida sua sustentabilidade financeira.
Os medicamentos de especialidades, que formam o chamado mercado non-retail, movimentaram em torno de R$ 62 bilhões no ano passado. As distribuidoras integrantes da ABRADIMEX respondem por metade desse montante. No entanto, as despesas e os níveis de exigência operacional aumentaram na mesma proporção.
“Com as farmacêuticas alocando mais esforços para pesquisa e desenvolvimento, nosso segmento assumiu tarefas adicionais na prestação de serviços, inclusive no ambiente intra-hospitalar. Em paralelo, o canal hospitalar não vem demonstrando fôlego financeiro, principalmente após a pandemia”, contextualiza Marcos Marques, presidente do conselho da associação.
As consequências desse panorama escancaram o descompasso. Em média, as distribuidoras concedem 75 dias de prazo de pagamento para hospitais e o período de estoque de cada SKU gira em torno de dois meses, totalizando 135 dias. Por outro lado, a indústria estabelece 42 dias de prazo médio, com uma semana para entrega.
“Isso resulta em 35 dias. Se fizermos a conta de 135 menos 35, na prática é como se estivéssemos bancando inteiramente 100 dias dessa operação. Nosso cash flow é baixíssimo, ainda mais se considerarmos a necessidade de atender cerca de 3,6 mil hospitais, o que equivale a 80% de cobertura, e 9,9 mil clínicas. O balanço final é um cash flow apertadíssimo”, adverte.
Distribuidoras da ABRADIMEX veem frete mais caro e concorrido
O custo do frete revela outro gargalo para as distribuidoras da ABRADIMEX. O Sindusfarma, inclusive, estima que os gastos envolvidos nesse processo encareceram até 50% com a adequação obrigatória à RDC 653. A resolução da Anvisa entrou definitivamente em vigor em março de 2024 e dispõe sobre o transporte de medicamentos refrigerados e sujeitos a controle de temperatura.
“A complexidade que cerca esses fármacos impõe o uso majoritário do frete aéreo, ainda mais caro. E também convivemos com o aumento da concorrência. Hoje, o caminhão que operadoras logísticas e transportadoras utilizam para distribuir carga seca, atendendo demandas dos e-commerces, é o mesmo disponibilizado para o setor farmacêutico”, ressalta Marques.
Números sugerem deficiência de acesso a medicamentos
Embora o segmento de distribuição mantenha capilaridade nacional, o cruzamento de números de mercado sugere o desalinhamento operacional dos hospitais e deficiência de acesso a medicamentos.
De acordo com a Anahp – Associação Nacional de Hospitais Privados, o tempo médio de internação dos pacientes caiu de 4,5 dias para 4,1 dias em cinco anos. E em duas décadas, a participação dos medicamentos na relação geral de despesas do canal hospitalar despencou de 40% para 12%. Quase metade dos gastos passou a ser destinada à folha de pagamento e a despesas de hotelaria.
“Parte das justificativas dos gestores passa pelo alto custo dos medicamentos, o que afeta a disponibilidade e, consequentemente, acaba levando à liberação precoce de pacientes. É uma conta perversa que vem se transformando em uma bomba-relógio, em um Brasil com dimensões continentais e onde o índice de não adesão a tratamentos chega a 56%, contra 50% da média mundial”, adverte.
Abertura de diálogo com a indústria
A ABRADIMEX vem procurando abrir frentes de diálogo com as farmacêuticas, sobretudo as multinacionais. “Em função de imposições das matrizes, essas companhias são as menos flexíveis em relação a prazos”, aponta. Marques sinaliza dois caminhos possíveis para minimizar o problema – o aumento do limite de pagamento à indústria para 90 dias ou mais facilidade de acesso a descontos para ampliar as margens.
“Obviamente, compreendemos o peso que a pesquisa e a concepção de novos medicamentos representa para as finanças da indústria farmacêutica. Mas sem abertura para um diálogo multilateral que viabilize o compartilhamento de custos, o resultado final será agravado. Com mais pacientes tendo que recorrer a atendimentos emergenciais, sufocando tanto a rede privada como a estrutura do SUS, teremos uma sobrecarga geral no sistema e toda a cadeia sairá perdendo”, finaliza.