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Gabinete paralelo ganha forma

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Sem cargo no governo federal, mas fonte de informações médicas para o presidente Jair Bolsonaro, a oncologista e imunologista Nise Yamaguchi entregou, ontem, à CPI da Covid uma das principais provas para o colegiado: uma minuta de decreto para incentivar o uso e a distribuição de cloroquina, hidroxicloroquina e azitromicina no Sistema Único de Saúde (SUS). Ficou patente, também, a preocupação da iniciativa na imagem do mandatário, corroborando para a existência de um gabinete paralelo.

Yamaguchi apresentou uma ata notarial, registrada em cartório por ela, mostrando uma troca de mensagens com o médico Luciano Azevedo em que os dois discutiam uma minuta de decreto sobre uso e distribuição de cloroquina. “Oi, Luciano, este decreto não pode ser feito assim, porque não é assim que se regulamenta a pesquisa clínica. Tem normas próprias. Exporia muito o presidente”, diz a mensagem, em resposta a Azevedo, depois que ele enviou a minuta do decreto. O documento foi, segundo a médica, apresentado em reunião no Palácio do Planalto com o então ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta; o diretor-presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), Antonio Barra Torres; o ministro Braga Netto e Luciano Azevedo.

Mandetta e Barra Torres afirmaram, à CPI, que na reunião foi apresentada uma minuta visando mudar a bula da cloroquina para ser indicada a pacientes com covid-19. Ao apresentar cópia da minuta, Yamaguchi tentou justificar que não se tratava de pedido para alterar a bula. Na prática, entretanto, o documento visava à distribuição dos medicamentos no combate à covid-19, ou seja, “passar por cima da bula e da Anvisa“, como comentou o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE).

Apesar de negar a existência do gabinete paralelo, a médica confirmou ao menos quatro reuniões que teve com Bolsonaro para discutir, entre outros assuntos, o tratamento precoce contra o novo coronavírus. “Não é um aconselhamento, é uma interlocução”, alegou, acrescentando ter comparecido ao Ministério da Saúde “inúmeras vezes” para reuniões.

A defesa de Yamaguchi é de que existe um “conselho científico independente e voluntário”. “Queríamos oferecer o conhecimento de uma forma organizada, sem o vínculo oficial”. A turma, que seria de 10 mil médicos, terminou enfraquecida, segundo a médica, porque “houve uma perseguição tão grande da mídia que acabou dissolvendo o grupo”.

Além de médicos, ela citou a participação em reuniões do empresário Carlos Wizard; do então secretário de Comunicação da Presidência, Fabio Wajngarten; e o então assessor especial da Presidência Arthur Weintraub.

Na avaliação do vice-presidente da comissão, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), a tentativa de negar a existência do assessoramento é falha diante dos fatos. Segundo o parlamentar, a médica fez “um jogo de palavras”. “A minuta existiu. Ela diz que não pode ser feito assim, tem normas próprias, exporia o presidente. Por que está preocupada em expor o presidente se ela tinha convicção? Por que ela não submeteu (o documento) à Anvisa?”, questionou Rodrigues. Para ele, o depoimento dela e os anteriores comprovam “a existência de uma atuação pró-cloroquina, em vigor até hoje”.

Embate

Defensora convicta dos benefícios da cloroquina para tratar pacientes com covid-19, a médica recebeu uma série de críticas na sessão. As mais incisivas foram do senador Otto Alencar (PSD-BA). Ele chegou a questionar se a depoente sabia a diferença entre vírus e protozoário — microrganismo causador da malária, doença para a qual é recomendada a cloroquina. De acordo com ela, “protozoários são organismos celulares, e vírus são organismos que têm o conteúdo de DNA ou RNA”. Alencar rebateu: “É completamente diferente do que a senhora falou. A senhora não soube explicar o que é um vírus. Vírus não são nem considerados seres vivos, portanto, uma medicação para protozoário nunca cabe para vírus”, enfatizou. “A senhora não sabe nada de infectologia. Percebi logo no início. Não podia estar de jeito nenhum debatendo um assunto que não tem nenhum domínio. A senhora brincou com a saúde do povo brasileiro, falando em imunidade de rebanho, hidroxicloroquina, tratamento precoce.”

O presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM), também perdeu a paciência, após um vídeo no qual Yamaguchi defende tratamento precoce e diz que as pessoas não deveriam se vacinar “aleatoriamente”. Questionada sobre as declarações, ela as manteve. O parlamentar, então, pediu à população que desconsiderasse as orientações da médica. “Quem está nos vendo neste momento, eu peço que desconsidere essas questões que ela disse aqui em relação à vacina. Desconsidere o que ela está dizendo em relação à vacina, ela não está certa”, apelou Aziz. “A sua voz calma, a sua forma de falar convence as pessoas como se a senhora estivesse falando a verdade.”

Governistas atacaram a oposição pelo tom usado com a depoente. “Foi uma reunião extremamente desagradável. Foi duro para quem estava testemunhando tudo o que aconteceu na CPI”, protestou Marcos Rogério (DEM-RO). “A oposição tem dois pesos e duas medidas. Quando vem alguém com divergência, que pensa diferente, mesmo que tenha um currículo como o da doutora Nise Yamaguchi, eles maltratam, ofendem, desrespeitam.”

Eduardo Girão (Podemos-CE) foi na mesma linha. “Eu me senti constrangido com a forma como ela foi abordada. Qualquer pessoa de bem que tenha sensibilidade ficou com repugnância em relação ao que aconteceu. Isso não se faz”, reclamou.

Fonte: Correio Braziliense

Veja também: https://panoramafarmaceutico.com.br/para-presidente-da-cpi-governo-tinha-gabinete-paralelo-e-nunca-apostou-em-vacinas/

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