Há uma semana, o G1 revelou que o estado de São Paulo contava com estoque de remédios do “kit intubação” suficiente para apenas uma semana. Nesta terça-feira (30) a secretaria estadual confirmou que o saldo de ‘”diversos itens se esgotou na primeira quinzena de março”, e acusou o governo federal de ter enviado, no último final de semana, apenas 1,9% do número de ampolas necessário para atender a demanda mensal da rede pública estadual.
“O governo federal liberou, no final de semana, somente 65.770 ampolas de neurobloqueadores e anestésicos, o que corresponde a apenas 1,9% do que é preciso para atender a demanda mensal da rede pública de saúde de SP, de 3,5 milhões de ampolas. Essa quantidade equivale à necessidade para consumo por cerca de 12 horas na rede pública de saúde”, disse a secretaria da Saúde de SP.
Ainda segundo a pasta estadual, o Ministério havia sinalizado que entregaria 258.874 ampolas, mas a quantidade recebida representa somente 25,4% do montante prometido.
O G1 entrou em contato com o Ministério da Saúde, mas não recebeu retorno até a última atualização desta reportagem. Em nota enviada na última semana, o governo federal alegou que o cronograma de entregas desses medicamentos é feito com base no monitoramento realizado nos estados e municípios, em parceria com o Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass), o Conselho Nacional de Secretarias Municipais da Saúde (Conasems) e a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
Para contornar a falta dos produtos, os médicos da capital estão mudando o protocolo de atendimento e utilizando outros remédios para sedar os pacientes internados e prepará-los para o procedimento de intubação.
“As principais opções acabaram. A gente está tendo que contornar com medicações que não são tão fortes, então os pacientes não ficam tão sedados, ficam desconfortáveis com a ventilação, então além de ser dramático, o trabalho fica abaixo em termos de qualidade. Traduzindo: é perda de vidas mesmo”, disse um intensivista do hospital San Paolo, na Zona Norte da capital.
“As principais opções acabaram. A gente está tendo que contornar com medicações que não são tão fortes, então os pacientes não ficam tão sedados, ficam desconfortáveis com a ventilação, então além de ser dramático, o trabalho fica abaixo em termos de qualidade. Traduzindo: é perda de vidas mesmo”, disse um intensivista do hospital San Paolo, na Zona Norte da capital.
No A.C. Camargo, outro hospital da capital, a escassez fez com que os médicos passassem a mudar o protocolo de intubação.
“No chamado kit intubação que a gente precisa analgésico, precisa de bloqueadores neurocelulares e sedativos, e a gente sabe que tem medicamento em falta no Brasil inteiro. Isso não é diferente em SP. Na verdade o que está se fazendo é mudar protocolos, usar medicamentos diferentes pra que o paciente não deixe de ser assistido da melhor maneira possível”, explicou Ivan França, infectologista chefe do hospital A.C. Camargo.
Por conta do baixo estoque dos remédios do kit intubação, a Secretaria da Saúde disse, na última terça (23), ter orientado os gestores dos serviços de saúde que compõem as redes pública e privada do estado a manter o monitoramento da demanda e a utilizar “racionalmente estes produtos e otimizem medidas para garantir assistência a quem precisa”.
‘Situação extremamente caótica’
A escassez de medicamentos para intubação contribuiu para o maior esgotamento dos profissionais de saúde nas últimas semanas, segundo um médico intensivista da capital.
Plantonista em hospitais públicos e particulares da cidade, ele afirma que, com a sedação inadequada dada aos pacientes, os plantões ficaram mais cansativos.
“A situação está extremamente caótica. É extremamente frustrante fazer plantão, é cansativo física e mentalmente. Equipe de enfermagem, médico, técnico, tá todo mundo cansado. A gente consegue ver cada vez mais sinais de estresse, desentendimentos na equipe. Tá indo ladeira abaixo e nunca esteve tão ruim assim”, disse.
“A situação está extremamente caótica. É extremamente frustrante fazer plantão, é cansativo física e mentalmente. Equipe de enfermagem, médico, técnico, tá todo mundo cansado. A gente consegue ver cada vez mais sinais de estresse, desentendimentos na equipe. Tá indo ladeira abaixo e nunca esteve tão ruim assim”, disse.
“É uma cena de guerra. Ambulâncias chegando de um em um minuto, paciente intubado até no centro cirúrgico, cirurgia sendo cancelada porque tem paciente internado na sala de cirurgia. Tá caótico, e a gente não tá vendo melhora”, explicou.
Para o profissional, o trabalho nas UTIs tornou-se frustrante, especialmente diante do quadro de pacientes graves.
“É extremamente frustrante. A palavra é essa, eu estou extremamente frustrado. Nosso trabalho não tá valendo nada. A gente vê que os pacientes estão cada vez piores. A gente passa o plantão inteiro em um paciente, e no final do plantão a gente vê que ele está mais grave do que a gente admitiu”, lamentou.
Fonte: G1
Veja também: https://panoramafarmaceutico.com.br/2021/03/31/anvisa-aprova-novo-medicamento-do-kit-intubacao-com-regra-flexivel/