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Ministério da Saúde diz que estuda produção nacional de medicamentos para hanseníase após crise de abastecimento

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Brasil é líder no número de casos de hanseníase no mundo, mas depende de doação da OMS dos antibióticos para tratar a doença. Desde dezembro de 2019, país enfrenta problemas para receber remédios e milhares de brasileiros estão sem tratamento.

O Ministério da Saúde informou ao G1 que estuda produzir no país os medicamentos usados no tratamento da hanseníase, os antibióticos rifampicina, clofazimina e dapsona. Há décadas, o Sistema Único de Saúde (SUS) depende de doações da Organização Mundial da Saúde (OMS) para disponibilizar os remédios à população.

“No final de 2020, a pasta realizou audiência pública com produtores nacionais no intuito de viabilizar a produção da poliquimioterapia (PQT) em território nacional”, informou o Ministério da Saúde nesta quarta-feira (3).

“A pasta deve se reunir novamente com as empresas para discussão das propostas que são encaminhadas ao Ministério da Saúde pelos laboratórios públicos e privados. Paralelo a isso, a pasta já está em diálogo com Biomanguinhos/Fiocruz que também deve apresentar um projeto de produção de medicamentos para hanseníase”, completa.

A pasta enviou a nota após ser questionada sobre o desabastecimento dos remédios que ocorre no país desde o segundo semestre de 2020. Em dezembro de 2019, a OMS informou aos países que dependem das doações dos antibióticos que passaria por problemas de produção durante 2020, mas o governo brasileiro não adotou medidas para garantir o fornecimento dos antibióticos no SUS.

Desde o ano passado, alertas e recomendações foram emitidas pela Organização das Nações Unidas (ONU) diretamente ao governo brasileiro cobrando ações para resolver a crise dos remédios. Em um dos documentos, a entidade recomendou que o Brasil se torne soberano na produção dos remédios.

“A situação é catastrófica e tem um caráter de urgência. Por isso, a ONU recomendou ao governo brasileiro que comece a produzir o PQT. O país tem condições técnicas e recursos econômicos para se tornar soberano nessa produção” , explicou Alice Cruz, relatora especial da ONU.

Na nota enviada nesta quarta, o Ministério da Saúde também informou que iniciou a distribuição de mais de 50 mil cartelas dos antibióticos aos estados, o que, segundo a pasta, irá normalizar o abastecimento.

“Foram distribuídos, também, Minociclina e Prednisona. Atualmente, a pasta aguarda a liberação sanitária para autorização de embarque de nova carga no quantitativo de 103.680 cartelas”, informou a pasta.

O Brasil é o país com o maior número de casos de hanseníase por habitantes no mundo – diagnosticamos cerca de 30 mil novos casos por ano, mas a Sociedade Brasileira de Hansenologia estima que esse número pode ser até 5 vezes maior.

Os remédios vindos das doações diretas da OMS são repassados ao SUS e não são vendidos nas farmácias. Assim, todo paciente brasileiro depende exclusivamente do bom funcionamento do sistema de saúde para ter acesso ao tratamento.

A crise no tratamento da hanseníase

Levantamento do Movimento de Reintegração das Pessoas Atingidas pela Hanseníase (Morhan) aponta que municípios de pelo menos 18 estados do país estão sem os remédios usados para tratar a hanseníase. A entidade reuniu mais de 100 relatos em janeiro de pacientes que estão desde o 2º semestre de 2020 sem tratamento.

Em agosto, tanto o Morhan quanto a Sociedade Brasileira de Hansenologia (SBH) realizaram audiência com o Ministério Público Federal (MPF) para relatar a crise.

“Começamos a receber tanta denúncia de pessoas com o tratamento interrompido que abrimos um formulário online para receber os relatos. No dia 27 de janeiro, lançamos uma petição para pressionar o governo mais uma vez”, explica coordenador do Morhan, Artur Custodio.

As primeiras reclamações recebidas pelo Movimento no ano passado, explica Custodio, foram de médicos e profissionais da saúde, desesperados ao ver que as cartelas dos remédios estavam acabando.

“Há mais de 30 anos trabalho diretamente com o acometido pela hanseníase e em todo esse tempo nunca tivemos falta de medicamentos do PQT”, conta um médico de Rondônia que preferiu não ser identificado.

“Os pacientes reclamam muito sobre a falta de medicação. É muito difícil dizer para eles que não tenho previsão da chegada da medicação”, diz outro médico anonimamente, dessa vez de Pernambuco.

Segundo o presidente da Sociedade Brasileira de Hansenologia, Claudio Salgado, a situação se tornou crítica em agosto, quando acabaram todos os estoques de Pernambuco, de São Paulo e do Pará. O dermatologista atua no estado paraense e conta que, naquele mês, que pelo menos 20 pacientes foram diagnosticados com a doença e enviados para a casa sem o tratamento.

Em novembro, o Ministério da Saúde enviou um documento em reposta à ONU afirmando que tinha pedido à OMS doses adicionais do PQT para 2020, e logo depois foi informado que a produção do remédio passava por problemas e que a demanda adicional seria inviável.

No mesmo documento, o Brasil afirmou que recebeu um carregamento da OMS em 3 de setembro e encaminhou aos estados. E que “os problemas decorrentes da falta de PQT no SUS afetaram apenas a oferta de tratamento multibacilar de adultos”.

 40 mil em tratamento

Mais de 40 mil brasileiros estão em tratamento de hanseníase e dependem desses remédios, segundo dados de agosto de 2020 do Ministério da Saúde.

A psicopedagoga Tatielle Naiara, de 24 anos, moradora de Tapurah, interior do Mato Grosso, é uma desses 40 mil brasileiros desassistidos. Ela estava em tratamento de hanseníase há quatro meses quando o tratamento teve que ser interrompido por falta de remédio. Já são mais de quatro meses sem tratar a doença e os retrocessos começam a dar sinais.

“Não consigo fazer mais nada que force as minhas mãos, como segurar uma caneta, escrever, digitar no computador ou celular por muito tempo. O mesmo está acontecendo com a perna direita, estou arrastando para andar. Meus nervos voltaram a inflamar e as câimbras nos pés, que tanto me incomodavam antes do tratamento, voltaram” – Tatielle, 24 anos, paciente de hanseníase há 4 meses sem tratamento.

Sem previsão de chegada dos remédios e com medo do avanço da doença, a jovem começou a se sentir ansiosa.

“Tive crises de pânico assim que os remédios foram cortados. Desde então, tomo quatro antidepressivos por mês”, diz.

Tatielle e mais sete pessoas da família foram diagnosticadas com hanseníase em 2018, durante uma campanha de prevenção da doença que ocorreu na sua cidade.

“Sinto dores nas juntas desde os 12 anos, mas os médicos achavam que era reumatismo infantil. Quando minha avó fez o exame na campanha e descobriu que tinha hanseníase, eu e minhas primas, que fomos cuidadas por ela na infância, resolvemos fazer. Todas fomos diagnosticadas”, conta.

Tatielle é a única da família que ainda estava em tratamento quando teve início a crise de abastecimento de remédios no SUS. Isso porque o seu primeiro tratamento, feito durante os 12 meses de 2018 sem interrupção, não foi eficaz.

Fonte: Portal G1.com

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