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Suspensão do uso medicinal da maconha atinge centenas de famílias pernambucanas

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O uso medicinal da maconha está no centro de uma disputa, atingindo diretamente a qualidade de vida de cerca de 14 mil famílias de pacientes, acometidos com doenças como câncer, epilepsia, alzheimer, esquizofrenia e esclerose. Organizações do setor denunciam o pedido da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para que a Justiça suspenda a liminar, em vigor desde 2017, que permite o cultivo e comercialização do óleo da cannabis para fins de tratamento, sobretudo de crianças e adolescentes. A decisão está nas mãos dos juízes do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, com sede no Recife, que informou que o caso será apreciado no próximo dia 18 de março. Até lá, os pais que dependem desta extração da erva para a evolução do quadro de saúde de seus filhos, demonstram grande preocupação.

Com a medida, a Abrace Esperança, associação de pacientes com sede em João Pessoa, no estado da Paraíba, que atualmente distribui para todo o país, perderia o direito de manter a atual plantação da Cannabis Sativa. No laboratório da entidade, localizado a 110 km da capital pernambucana, são originados produtos como pomadas, extratos e sprays nasais, repassados por um valor mais baixo ou até sem custo, para quem comprova não ter condições de pagar. Apesar dos benefícios, a utilização ainda enfrenta bastante preconceito e resistência na sociedade mais conservadora. Para comprar o óleo, se faz necessário uma receita, prescrita por médico habilitado, algo que nem sempre é fácil de encontrar para quem está em busca desta alternativa.

“Meu filho chegava a ter 80 convulsões por dia, se machucando bastante, uma situação que provocava muito sofrimento não apenas para ele, mas para todos ao seu redor” relata a design de interiores, Hélida Lacerda, de 44 anos. Moradora do bairro de Arthur Lundgren I, em Paulista, ela é mãe do adolescente Anthony, que tem epilepsia refratária e utiliza o tratamento com o óleo há quatro anos. “O uso da maconha era uma coisa que eu escutava falar, mas tinha certo medo. Também faltava alguém para me orientar melhor”, revela. Segundo a genitora, os gastos mensais com até 15 tipos de comprimidos hoje foram eliminados, com uma redução média de R$ 700 para R$ 300. “Ele evoluiu muito e hoje passa meses sem ter nenhuma convulsão. Ficou mais ativo e demonstra muito mais saúde. Vê-lo assim é o que me motiva a viver”, conta.

A evolução no tratamento levou Hélida a se mobilizar para ajudar outras pessoas na busca por soluções eficazes no tratamento de doenças de ordem neurológica. Com a ajuda de amigas, fundou a Associação Aliança Canábica de Pernambuco, com sede no Recife, que hoje apoia 60 famílias, dependendo diretamente da produção oriunda da Paraíba. Nesta realidade está a dona de casa, Edcleide Santana, 38, mãe do pequeno Erick, de oito anos, que reside no bairro da Guabiraba, na Zona Norte do Recife. “Meu filho era uma criança que só dormia, sem qualquer contato com o mundo ao redor. Com apenas três gotas do óleo, diariamente, ele praticamente renasceu”, conta com a voz embargada. Segundo ela, a utilização do produto representa esperança de dias melhores. “Se esta chance for cortada, estaremos completamente desabrigados. Hoje vivo de um salário mínimo e jamais teria condições de exportar a cannabis, ou mesmo ter que adquiri-la de grandes empresas como eles querem nos impor”, afirmou. Em Pernambuco, 11 famílias contam com autorização para o cultivo em casa, sendo 37 em todo o país.

A doutora em ciências farmacêuticas e tutora da Faculdade Pernambucana de Saúde (FPS), Elisângela Silva, estuda o uso medicinal da Cannabis Sativa, com suas diversas formas de aplicação. “É importante destacar que o canabidiol vem sendo utilizado em pacientes que não responderam a outros tratamentos anticonvulsivos, representando resultados significativos. Estamos falando da extração de elementos que apresentam diversas propriedades farmacológicas, com uma manipulação responsável. Essa extração, quando feita corretamente, não apresenta qualquer efeito psicoativo, bastante diferente do chamado uso recreativo”, explicou. Segundo a especialista, a planta apresenta ações analgésicas, terapêuticas, além de coibir perdas neurológicas. A aprovação pela Anvisa, em 2017, do primeiro medicamento à base de maconha, destinado a pacientes com esclerose múltipla, desencadeou diversas pesquisas desde então.

 

“Tivemos grandes avanços, nos últimos anos, com a reinserção da cannabis na farmacopeia brasileira. Deixar de enxergar tudo isso seria, além de prejudicial às famílias e seus pacientes, um grave retrocesso e uma perda de direitos adquiridos”, acrescenta Elisângela. O cenário é reforçado pela médica recifense, Adriana Rocha, que costuma prescrever a cannabis para os pacientes acompanhados em consultório. Para ela, o imbróglio envolvendo a suspensão do uso atenderia a interesses comerciais. “Infelizmente, nos deparamos com uma manipulação da indústria farmacêutica, aliada aos altos poderes. Os grandes laboratórios se mostram interessados na monopolização do produto, pesando muito mais o fator econômico em desfavor da vida”, critica.

Conforme a Abrace, a associação estaria sendo acusada de realizar uma manipulação em larga escala e sem os devidos cuidados, o que não seria real. A entidade afirma que mantém o controle de qualidade, através da análise microbiológica e de materiais pesados. O processo envolve equipamentos de marcas validadas e a adoção de um software de ponta. Os produtos, conforme esclarece, são rastreados da semente até o frasco final que chega às mãos do paciente. A ameaça levou a Abrace a lançar uma campanha nas redes sociais, com hashtag #abracenaopodeparar, gerando centenas de manifestações, incluindo artistas e políticos.

Procurado pelo Diario, o TRF-5 informou que o processo vem sendo analisado pelo desembargador federal Cid Marconi, assinalando que a associação não providenciou, até o momento, documentos como a Autorização Especial (AE), nem a Autorização de Funcionamento (AFE), junto aos órgãos da União. Também questionada, a Anvisa informou que a Abrace não estaria cumprindo a determinações, o que teria obrigado a agência a relatar o caso à esferas judiciais superiores. Em nota, a Anvisa informou que “Após infrutíferas tentativas de sanar os problemas, se fez necessário evitar um risco sanitário que possa agravar a saúde dos pacientes”, disse o documento, que prossegue “A Anvisa age sempre com foco no compromisso de proteger e promover a saúde da população, mediante a intervenção, quando necessária”, finalizou.

 

Fonte: Diário de Pernambuco

Veja também: https://panoramafarmaceutico.com.br/2021/03/17/suspensao-do-uso-medicinal-da-maconha-atinge-centenas-de-familias-pernambucanas/

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