Os estudos clínicos de cannabis exigirão um custo de R$ 300 milhões nos próximos três anos para comprovar sua eficácia e segurança. A estimativa partiu da Associação Brasileira da Indústria de Canabinoides (BR Cann). As pesquisas são uma exigência da Anvisa para o registro definitivo dos produtos.
Em maio, a autarquia aprovou a Análise de Impacto Regulatório (AIR), documento essencial para a revisão da RDC 327/19 e que contribui para nortear novos ensaios clínicos. A medida visa a priorizar a comercialização de produtos de cannabis nas farmácias e drogarias sujeitas à vigilância sanitária.
Quando entrou em vigor, em 2020, a RDC 327 concedeu autorização temporária para os produtos, com a condição de que estudos sobre o tema fossem realizados posteriormente. “Trata-se de uma exigência regulatória para que sejam qualificados como medicamentos, tenham seus preços regulados pela Câmara de Medicamentos (CMED) e, eventualmente, incluídos na Conitec”, explica a diretora executiva da entidade, Bruna Rocha.
Estudos clínicos com baixa demanda
O prazo para envio desses estudos termina em março de 2025. Mas, até agora, poucas empresas iniciaram os trabalhos. De acordo com Bruna, o atraso está diretamente atrelado ao cenário de pandemia. Ela avalia haver um interesse do setor em atender às exigências, mas constata que uma prorrogação do prazo será necessária por parte da agência. “Acredito que será exigido um certo comprometimento com o próximo passo, até porque a RDC 327 em si é transitória”, explica.
Bruna afirma que muitas empresas interessadas em ingressar no mercado correm contra o tempo para apresentar seus pedidos de registro na Anvisa. “Há mais cautela entre aqueles que já estão no mercado e aguardam os próximos passos que serão definidos pela agência”, acrescenta.
Valor dos investimentos pode dobrar
Até o momento, a Anvisa já emitiu 39 autorizações sanitárias para produtos de cannabis no contexto da RDC 327, dos quais 26 estão efetivamente no mercado. No entanto, existem 41 autorizações sanitárias aguardando aprovação da agência para dispensação no varejo farmacêutico.
“Se todas essas autorizações forem concedidas e houver ampliação no número de players no mercado, o valor dos investimentos pode até dobrar”, pontua Bruna. Nos últimos 12 meses, as vendas de produtos de cannabis movimentaram R$ 170,2 milhões, com 438 mil unidades vendidas e 95 mil pacientes atendidos.
Apenas entre janeiro e abril de 2024, foram comercializadas 165,8 mil unidades, um aumento de 96% em relação ao mesmo período do ano anterior. A projeção do faturamento do setor para o ano de 2024 ultrapassa a marca de R$ 250 milhões.
Um mercado em transformação
O crescimento deste mercado regulado impulsionou a concorrência e o consumo local, resultando em uma redução contínua nos preços dos produtos de cannabis disponíveis nas farmácias do país. Ao mesmo tempo, observou-se uma queda histórica de 25% no valor médio dos produtos nos últimos três anos.
“Esses investimentos também são uma estratégia essencial para liderar um segmento em expansão. Isso também proporcionará produtos seguros e eficazes aos pacientes, ao mesmo tempo em que reduzirá a circulação de mecanismos alternativos não regulados no Brasil”, pontua a executiva.
Financiamento para pesquisas clínicas sobre cannabis
Em janeiro deste ano, a Finep abriu dois chamamentos públicos com uma linha temática para insumos farmacêuticos ativos (IFAs) de cannabis. Os fundos não são contingenciados. Ou seja, os recursos estarão disponíveis por força de lei, não podendo ser bloqueados.
“A cannabis ainda tem representatividade muito baixa nos pedidos de financiamento e figura em apenas 10% dos projetos. E a maior parte dessas demandas seria direcionada para o desenvolvimento de produtos e não para pesquisas clínicas, que abririam muito mais o mercado”, comenta Igor Bueno, gerente do departamento de saúde da Finep.
Atualmente, o MCTI apoia dois projetos por meio de emendas parlamentares. Ambos têm como objetivo viabilizar estudos sobre a toxicidade da cannabis em animais e a aplicação da planta em estratégias de combate ao alcoolismo.