Uma nova molécula brasileira, ainda não nomeada, foi uma das principais atrações do encontro anual da Sociedade Americana de Oncologia Clínica (Asco). No evento, realizado em Chicago (EUA), Moacyr Bighetti, CEO da PHP Biotech, dona dos direitos de exploração da inovação, se reuniu com representantes de grandes farmacêuticas para detalhar o seu funcionamento. As informações são da revista Veja.
Com DNA nacional, a substância foi desenvolvida a partir de uma proteína presente no veneno de uma espécie local de cascavel. A crotoxina, caracterizada por sua atividade antitumoral, precisou ser reproduzida pelos cientistas da startup para que pudesse ser introduzida em organismos humanos sem causar intoxicação.
Método de funcionamento da molécula brasileira surpreende
Durante testes de laboratório a molécula apresentou um comportamento promissor. Ao contrário dos atuais métodos de tratamento contra o câncer, como a quimioterapia, que mata as células tumorais por necrose, gerando inflamação e reações adversas aos pacientes, a nova substância induz os organismos cancerígenos a um suicídio programado. O processo, conhecido como apoptose, é capaz de eliminar corpos indesejados sem afetar os elementos saudáveis do organismo.
“Descobrimos que nosso peptídeo ativa a p53, proteína produzida pelo gene supressor de tumores. Nenhum tratamento aprovado no mundo, hoje, tem essa ação seletiva”, conta Bighetti.
“O p53 é um gene que codifica uma proteína encontrada no núcleo das células. Ela monitora o DNA em busca de danos induzidos por diferentes fatores, como radiação, tabagismo, álcool, vírus, entre outros. Quando certas alterações no DNA são detectadas, a proteína é capaz de interromper o ciclo celular e impedir que essa célula se replique até que o dano seja corrigido. Agora, se o dano for muito grave, ela induz à apoptose. Assim, evita que células danificadas se multipliquem e formem tumores. Por isso, o gene é conhecido como o guardião do genoma”, explica Eduardo Braun, oncologista e membro do conselho da PHP Biotech.
Ainda, segundo o médico, mais da metade dos casos de câncer registrados atualmente podem ser atribuídos a uma mutação no gene p53. Essas células com funcionamento anormal acabam se multiplicando, abastecendo os tumores.
Contratempo nas pesquisas gerou nova inovação
O maior obstáculo no desenvolvimento desse potencial fármaco foi a definição de uma maneira de entrega da molécula. Era necessário encontrar um modo de fugir da circulação, cheia de células de defesa contra organismos estranhos, e se conectar as estruturas cancerígenas alvejadas.
Para lidar com esse contratempo, os pesquisadores da empresa brasileira desenvolveram um novo nanocorpo, construído a partir de células comuns ao camelídeos (família da qual fazem parte os camelos, dromedários e lhamas) adaptadas para o organismo humano.
“Uma vez dentro da célula, ele libera vias de sinalização que estimulam a ativação do p53 e chamam a atenção do sistema imunológico”, conta Bighetti. “A ideia é testá-lo em tumores sólidos agressivos, entre eles o câncer de mama triplo-negativo. Inclusive, observamos que ele consegue ultrapassar a barreira hematoencefálica, que protege o cérebro, podendo ser uma opção no tratamento de tumores do sistema nervoso”, complementa o CEO.
Expectativas futuras
Segundo a PHP, detentora da patente do fármaco, o início das pesquisas clínicas, com seres humanos, está previsto para até 2026. O lançamento definitivo, no entanto, ainda é longínquo, uma vez que os testes precisarão confirmar sua segurança, eficácia, dosagem e possíveis aplicações e contraindicações.