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Medicamento é direito, não regalia

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O Superior Tribunal de Justiça (STJ), recentemente, julgou recurso representativo sobre o fornecimento de medicamentos de alto custo que estão fora da tabela do SUS e estabeleceu três requisitos para que o Estado seja obrigado a fornecer esses medicamentos. O primeiro deles é que haja prescrição médica; o segundo, comprovação de que a pessoa não tem condições de arcar com o custo do medicamento e que o remédio esteja registrado na lista da Anvisa. Portanto, o próprio STJ não limitou o acesso a medicamentos de alto custo por conta de questões orçamentárias.

No entanto, a imprensa tem noticiado decisões judiciais desfavoráveis ao cidadão, por se entender que o custo do medicamento (às vezes decisivo para a sobrevida) causaria suposto desequilíbrio no orçamento do SUS. Em síntese, acarretaria gasto de verba significativa destinada ao atendimento do restante da população, que ficaria prejudicada. Haveria ofensa ao princípio da igualdade, porque a minoria que busca o Judiciário acabaria favorecida em detrimento da maioria.

O princípio da igualdade é interpretado como se aquele que acessa o judiciário fosse um privilegiado em relação ao restante da população, porque consumiria grande verba e prejudicaria os demais. O custo do tratamento do cidadão chegou até mesmo a ser analisado pelo Judiciário sob a ótica do “custo-efetividade”, como se investir em um cidadão fosse melhor do que investir em outro.

Já que há atenção para os dados de realidade dos custos dos remédios e dos cofres públicos, seria interessante que se atentasse, também, para outros aspectos relevantes. Em tempos de operação Lava-Jato e de descobertas de desvios incalculáveis do dinheiro público, soa indigno um cidadão ter um pedido dessa natureza negado.

O cidadão paga seus tributos e há, também, muitos casos em que paga custas judiciais para promover a ação (afinal, nem todos pedem gratuidade). O cidadão contribui para a arrecadação estatal e, quando se socorre do Judiciário contra os entraves públicos, recebe, agora, uma negativa, baseada no custo do seu tratamento. Ao que se percebe, o brasileiro acaba pagando a conta várias vezes.

O fundamento principal das decisões favoráveis ao fornecimento de medicamentos sempre foi a Constituição Federal, lei maior do ordenamento jurídico brasileiro, que impõe a supremacia dos direitos à vida, à saúde e à dignidade humana, pois são superiores aos entraves criados pelas leis e atos normativos do SUS.

As doenças são democráticas, atingem todos. Em geral, as doenças que demandam medicamentos de alto custo ou excluídas pelo SUS são doenças graves ou raras e independem da situação socioeconômica do indivíduo. Seria um privilégio precisar do Judiciário para obter um remédio caro para sobreviver? Percebe-se que o infortúnio do doente é encarado como regalia que causaria o desequilíbrio das contas públicas.

Vale lembrar que um dos pilares do sistema tributário brasileiro é o princípio da capacidade contributiva. Aquele que tem maior renda, paga maiores impostos. E vice-versa. Assim, é justo o cidadão ter os seus tributos calculados sobre o valor da sua receita. Porém, percebe-se que quando o cidadão precisa do Estado, seu pedido é injustamente negado, com base no valor da sua despesa. Vale atentar que nem sequer existe um critério de igualdade baseado somente no custo do tratamento e, não raras vezes, aquele que precisa do remédio caro é um grande e pontual contribuinte.

Como dizia o professor Bandeira de Mello, atender ao princípio da igualdade é tratar desigualmente os desiguais, na medida das suas desigualdades. Uns precisam mais, outros menos. Uns contribuem mais e outros menos e, nem por isso, devem ser mais ou menos atendidos pelo Estado. Assim, propõe-se aqui a reflexão sobre os inovadores posicionamentos desfavoráveis ao cidadão, pois a realidade é que a vida humana é mais importante do que a especulação sobre o orçamento público, já que a razão de ser do próprio Estado é a existência digna do seu povo.

Fonte: Correio Braziliense

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