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Gabapentina: milhões tomam remédio para dor cuja eficácia não é comprovada

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Um dos medicamentos controlados mais amplamente prescritos, a gabapentina, está sendo tomado por milhões de pessoas, apesar de pouca ou nenhuma evidência de que possa aliviar a dor.

Em 2006, escrevi sobre a gabapentina depois de descobrir acidentalmente que ela poderia combater os calorões da menopausa.

A droga foi inicialmente aprovada há 25 anos para tratar distúrbios convulsivos, mas agora é comumente prescrita para tratar todos os tipos de dor, aguda e crônica, além de fogachos, tosse crônica e uma série de outros problemas médicos.

A Administração de Alimentos e Drogas (FDA, na sigla em inglês) aprova um medicamento para usos e doses específicos se a empresa demonstra que ele é seguro e eficaz para seus usos pretendidos e se seus benefícios superam quaisquer riscos potenciais. Mas os médicos podem prescrever legalmente qualquer um que tenha sido aprovado pela FDA para qualquer condição, não apenas aquelas para as quais foi aprovado. Isso pode deixar os pacientes à mercê do que o médico acredita ser útil.

Assim, pode acabar sendo tarefa do próprio paciente tentar determinar se um medicamento prescrito para outros usos é seguro e eficaz para sua condição particular. Essa não é uma tarefa fácil, mesmo para profissionais bem informados, quanto mais para pessoas desesperadas de dor.

Recentemente, dois especialistas revisaram as evidências publicadas sobre os benefícios e os riscos do uso não específico da gabapentina (vendida originalmente como Neurontin) e da Lyrica (pregabalina) para tratar todos os tipos de dor.

(Há agora também uma terceira droga, gabapentina encarbil, vendida como Horizant, aprovada somente para a síndrome das pernas inquietas e para a neuralgia pós-herpética, que pode se seguir a uma crise de herpes.)

Os revisores, Christopher W. Goodman e Allan S. Brett, da Escola de Medicina da Universidade da Carolina do Sul, descobriram que as drogas, chamadas gabapentinoides, não funcionavam muito bem na maioria dos casos para os quais estavam sendo prescritas.

Como Goodman disse em uma entrevista: “Há poucos dados para justificar o modo como essas drogas estão sendo usadas e a razão pela qual estão entre as dez mais vendidas. Os pacientes e os médicos devem entender que há evidências limitadas para justificar seu uso em muitas condições, e pode haver alguns efeitos colaterais prejudiciais, como sonolência, tontura e dificuldade de andar.” Além disso, para pacientes propensos a transtornos por uso de substâncias, como a dependência de opioides, os gabapentinoides, embora não sejam opioides, são potencialmente viciantes, disse ele.

Os gabapentinoides simbolizam três problemas da prática da medicina: uma epidemia nacional mortal de dependência de opioides que faz os médicos procurarem drogas alternativas para a dor; o treinamento limitado em controle da dor recebido pela maioria dos médicos; e a influência da promoção agressiva e às vezes ilegal de medicamentos prescritos, inclusive mediante publicidade direta ao consumidor.

A gabapentina e o Lyrica, ambos vendidos pela Pfizer, foram aprovados pela FDA para tratar somente quatro problemas de dor debilitante: neuralgia pós-herpética, neuropatia diabética, fibromialgia e lesões da medula espinhal. Mesmo para esses usos aprovados, a evidência de alívio não é expressiva, relataram Goodman e Brett no periódico online Jama Internal Medicine.

Em muitos estudos bem controlados que eles analisaram, havia menos de um ponto de diferença na escala de dor de 10 pontos entre os pacientes que tomavam a droga versus um placebo, uma diferença clinicamente insignificante. Por exemplo, entre 209 pacientes com ciática, o Lyrica não reduziu significativamente a intensidade da dor nas pernas quando comparado com um placebo, e a tontura foi mais comumente relatada pelos 108 pacientes que tomaram o medicamento.

Mas, quando os pacientes se queixam de dor relacionada a condições que vão desde a ciática e a osteoartrite até a dor no pé e a enxaqueca, os médicos costumam pegar seu receituário e prescrever ou gabapentina ou o mais caro Lyrica.

Após a aprovação do Neurontin, seu fabricante na época, o laboratório Warner-Lambert, iniciou o que o governo determinou ser uma campanha de marketing ilegal que resultou em vendas superiores a US$ 2 bilhões um ano antes de sua patente expirar em 2004. Ainda assim, a campanha conseguiu chamar a atenção de muitos médicos que tratam de casos de dor persistente para a gabapentina.

Não é que não existam alternativas aos opioides para tratar a dor crônica, entre elas fisioterapia, terapia cognitivo-comportamental, hipnose e treinamento de meditação. Mas os médicos podem não saber das opções, muitas dos quais exigem mais esforço de sua parte do que simplesmente prescrever uma droga e não são tão fáceis ou acessíveis para pacientes quanto engolir uma pílula.

Como disse Michael E. Johansen, médico de família em Columbus, Ohio: “Uso a gabapentina clinicamente e tento adotar indicações aprovadas, mas, ocasionalmente, ficamos sem opções quando confrontados com pacientes com dor. É raro que essas drogas eliminem a dor, e não digo aos pacientes que ela vai acabar. Se houver algum benefício, provavelmente é marginal.”

Apesar da evidência limitada de benefícios, em um estudo publicado no Jama Internal Medicine em fevereiro, Johansen constatou que o número de pessoas que toma gabapentinoides mais que triplicou de 2002 a 2015, com mais de quatro em cada cinco tomando o genérico barato, gabapentina.

Em 2016, houve 64 milhões de prescrições de gabapentina, número que foi de 39 milhões em 2012, relataram Goodman e Brett no periódico The New England Journal of Medicine. Eles acreditam que, em parte, a epidemia de opioides promoveu esse aumento. “No trabalho com pacientes internados e ambulatoriais, observamos que os clínicos estão cada vez mais prescrevendo gabapentina e pregabalina para quase qualquer tipo de dor”, escreveram eles.

Johansen mencionou várias preocupações com o uso excessivo de gabapentinoides, incluindo “a escassez de dados de segurança em longo prazo, pouco efeito, a preocupação com o aumento do risco de overdose em combinação com o uso de opioides e altas taxas de prescrição não específica, que são associadas a altas taxas de efeitos adversos”.

O que contribui para o uso frequente de gabapentinoides é como os médicos interpretam o termo “dor neuropática”, para a qual as drogas são comumente prescritas. Ela é definida como a dor causada por uma lesão ou doença do sistema nervoso, levando os médicos a supor que, se uma droga é eficaz para um tipo de dor neuropática, é eficaz para todos os tipos, independentemente da causa, sugeriram Goodman e Brett.

Johansen disse que não há regras para o tratamento da dor com gabapentinoides. “Os médicos precisam trabalhar com um paciente por vez e descobrir o que funciona e o que não funciona”, disse. Ele observou que muitas vezes a dor passa com o tempo, mas os pacientes e os médicos podem atribuir a melhora à droga prescrita. Para aqueles que tomam um gabapentinoide, ele sugeriu que o médico reavalie o uso após dois ou três meses.

Mas Goodman aconselha a não largar a droga de repente, porque pode haver sintomas desagradáveis de abstinência.

Fonte: UOL

 

Veja mais: https://panoramafarmaceutico.com.br/2019/05/02/enxaqueca-nao-tem-cura-mas-pode-ser-controlada/

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